Teoria da radiação eletromagnética
Referência : Lage, E., (2023) Teoria da radiação eletromagnética,, Rev. Ciência Elem., V11(3):003
Autores: Eduardo Lage
Editor: João Nuno Tavares
DOI: [https://doi.org/10.24927/rce2023.003]
[editar] Resumo
O azul do céu e o vermelho no ocaso são manifestações da radiação eletromagnética gerada por cargas aceleradas. O campo da radiação deduz-se a partir dos potenciais retardados aqui definidos e obtidas as suas expressões exactas. Para grandes distâncias das fontes e pequenas velocidades das cargas, comparadas com a velocidade da luz, obtém-se uma boa aproximação para o campo de radiação caracterizado por depender da aceleração transversal, em relação à linha de visão do observador. Os resultados são aplicados ao estudo da radiação emitida por um oscilador harmónico e por uma carga em movimento circular, discutindo-se as difusões Thomson e Rayleigh, a instabilidade de modelos clássicos de átomos e a radiação emitida por um magneto em rotação que constitui um modelo aproximado para um pulsar.
As ondas eletromagnéticas são oscilações dos campos elétrico e magnético que se propagam no vazio com a velocidade da luz, sendo detetadas pelas suas interações com cargas e correntes. Inversamente, cargas e correntes que variam no tempo geram ondas eletromagnéticas — são as soluções particulares das equações[1]:
1c2∂2φ∂t2−Δφ=ρε0 (1)
1c2∂2→A∂t2−Δ→A=→iε0c2 (2)
Aqui, ρ e →i são as densidades de carga e corrente, as fontes do campo, enquanto que φ e →A são os potenciais eletromagnéticos a partir dos quais se deduzem os campos físicos:
→E=−▽φ−∂→A∂t (3)
→B=▽∧→A (4)
Se se projetar a equação (2) nos eixos cartesianos, facilmente se percebe que as três equações assim obtidas são analiticamente idênticas à equação (1). Considerar-se-á, então, a solução particular desta equação, adaptando-se imediatamente o resultado final para a solução da equação (2). Considere-se um pequeno volume localizado na origem das coordenadas de modo que a carga instantânea nesse volume é:
δQ(t)=ρ(→0,t)dV (5)
Será óbvio que a solução da equação (1) para esta carga apresenta simetria esférica. Assim, usando coordenadas esféricas[2], procura-se soluções da forma:
φ(r,t)=ψ(r,t)r (6)
Considere-se r≠0, de modo que o segundo membro da equação (1) é nulo para aquela carga. Obtém-se:
1c2∂2ψ∂t2−∂2ψ∂r2=0r>0
A solução genérica desta equação é a sobreposição de duas funções arbitrárias, cada uma só dependente de um único argumento[3]:
ψ(r,t)=f(r−ct)+g(r+ct) (7)
A função f, designada por solução retardada, representa uma onda esférica que se propaga a partir da origem, enquanto a função g (solução avançada) representa uma onda esférica que converge para a origem. Ora, é de esperar que a onda gerada pela carga δQ(t) se propague a partir da carga como exige o princípio da causalidade. Assim, será ignorada a solução avançada, o que introduz uma assimetria no tempo que não está presente nas equações de Maxwell.
Regressando à equação (1), com o segundo membro incluído e representando a carga, é evidente que, quando r→0, se deve encontrar o potencial eletrostático:
φ(r,t)→r→0δQ(t)4πε0r
Então, pelas equações (6) e (7), obtém-se:
f(−ct)=δQ(t)4πε0
Ora, a função f só tem um argumento, r−ct. Assim, com o resultado anterior, obtém-se a especificação completa desta função:
f(r−ct)=δQ(t−rc)4πε0=ρ(→0,t−rc)dV4πε0
Invocando a equação (6), deduz-se o potencial elétrico para esta carga situada, por hipótese, na origem:
φ(→r,t)=ρ(→0,t−rc)dV4πε0r
É, agora, possível generalizar. Primeiro, suponha-se que a posição da carga é →r′ e o ponto de observação é →r′, de modo que a distância entre a carga e o ponto é R=|→r−→r′|, pelo que a expressão anterior fica:
φ(→r,t)=ρ(→r′,t−Rc)dV′4πε0R
φ(→r,t)=ρ(→r′,t−Rc)dV′4πε0R
Segundo, para uma distribuição contínua de cargas, a solução retardada obtém-se por simples aplicação do princípio da sobreposição:
φ(→r,t)=14πε0∫dV′ρ(→r′,t−Rc)R (8)
Como referido anteriormente, a solução da equação (2) é:
→A(→r,t)=14πε0c2∫dV′→i(→r′,t−Rc)R (9)
Estas equações são as soluções exatas para distribuições arbitrárias de cargas e correntes. A partir delas deduzem-se os campos elétrico e magnético através das equações (3) e (4).

Interessa aqui considerar a geração de uma onda eletromagnética dentro de aproximações justificadas. Para isso, começa-se por notar que um raio de luz (FIGURA 1) é a propagação de energia no interior de um cone que subtende um ângulo sólido dΩ (FIGURA 2): o fluxo de energia, na unidade de tempo, através de qualquer base esférica à distância arbitrária, r,do seu vértice é Ir2dΩ, onde I é a intensidade da radiação, i.e., a grandeza do vetor de Poynting[4]:
→S=ε0c2→E∧→B

Ora, para uma onda eletromagnética propagando-se no vazio é B=Ec, pelo que I=|→S|∝E2. Assim, para um raio de luz, obtém-se E∝1r. É esta a característica fundamental do campo de radiação que se deve contrastar com o decaimento espacial do campo eletrostático para o qual é E∝1r2. Considerando a origem de coordenadas num ponto qualquer no interior da região onde se situam as fontes da radiação, então, numa primeira aproximação, os potenciais ficam, para grandes distâncias dessas fontes:
φ(→r,t)≃14πε0r∫dV′ρ(→r′,t−Rc) (11)
→A(→r,t)≃14πε0c2r∫dV′→i(→r′,t−Rc) (12)
O cálculo dos campos elétrico e magnético, equações (3) e (4), obriga a derivar estas expressões em ordem ao tempo e às coordenadas do vetor de posição →r. Ora, em relação a estas, irão ser ignoradas as derivadas do fator 1r, porque levam a um decaímento espacial ainda mais rápido dos potenciais. Assim, tais derivadas serão obtidas apenas do tempo retardado:
t∗=t−Rc (13)
Tem-se:
▽φ≃14πε0r∫dV′∂ρ(→r′,t∗)∂t(−▽Rc) (14)
Ora, sendo:
→R=→r−→r′ (15)
então:
▽R=→RR=→eR
onde →eR é o versor que aponta das cargas para o ponto de observação. Note-se que qualquer derivada em ordem a uma coordenada deste versor, é de ordem 1r pelo que será ignorada. Reescrevendo a equação (14):
▽φ≃−14πε0cr∫dV′∂ρ(→r′,t∗)∂t→eR (16)
Observa-se que a lei de conservação de carga[5] permite substituir a derivada da densidade de carga:
∂ρ(→r,t)∂t=−▽′⋅→i(→r′,t)
Aqui, ▽′ é o gradiente aplicado às componentes de →r′. Assim, na equação (16), tem-se:
∂ρ(→r′,t∗)∂t=−[▽′⋅→i(→r′,t′)]t′=t∗=−▽′⋅→i(→r′,t∗)+∂→i(→r′,t∗)∂t⋅▽′t∗=
=−▽′⋅→i(→r′,t∗)+∂→i(→r′,t∗)∂t⋅→eRc (17)
No segundo membro, o primeiro termo resulta da lei de conservação de carga na qual as derivadas em ordem às coordenadas são efectuadas com tempo fixo, posteriormente calculado no tempo retardado; no segundo termo, a primeira parcela efetua as derivadas espaciais da densidade de corrente incluindo o tempo retardado, corrigindo-se esta expressão na segunda parcela, com as derivadas espaciais do tempo retardado; no último termo, ficam explicitadas estas derivadas notando-se, apenas que ▽′R=−▽R. Substituindo na equação (16), tem-se:
▽φ≃14πε0cr∫dV′[▽′⋅→i(→r′,t∗)−∂→i(→r′,t∗)∂t⋅→eRc]→eR
No segundo membro, começa-se por incluir o versor →eR nas derivadas de ▽′, subtraindo a ação deste gradiente naquele versor; no primeiro caso, o teorema de Gauss anula o integral e, no segundo caso, obtém-se termos em 1R que se ignoram como atrás se referiu. Assim:
▽φ≃14πε0cr∫dV′[∂→i(→r′,t∗)∂t⋅→eRc]→eR (18)
Está calculada uma das parcelas do campo elétrico na equação (3). Quanto à outra parcela, usando a equação (12), tem-se, simplesmente:
∂→A(→r,t)∂t≃14πε0c2r∫dV′∂→i(→r′,t∗)∂t
Usando a equação (3), obtém-se finalmente:
→E(→r,t)=−14πε0c2r∫dV′[∂→i(→r′,t∗)∂t−(∂→i(→r′,t∗)∂t⋅→eR)→eR]=
=14πε0c2r∫dV′→eR∧(→eR∧∂→i(→r′,t∗)∂t) (19)
Quanto ao campo magnético, as equações (4) e (12) dão, nas aproximações referidas:
→B(→r,t)≃14πε0c2r∫dV′▽∧→i(→r′,t∗)=14πε0c2r∫dV′▽t∗∧∂→i(→r′,t∗)∂t=
=−14πε0c2r∫dV′→eRc∧∂→i(→r′,t∗)∂t (20)
Estas expressões serão agora utilizadas para obter uma fórmula aproximada para o campo de radiação originado por uma carga pontual (q) em movimento. Para isso, começa-se por discutir o que é o tempo retardado para tal carga. Considere-se a origem de coordenadas no ponto de observação e designe-se por →r(t) a posição instantânea da partícula. Então, usando a equação (13), o tempo retardado é definido por:
t∗=t−|→r(t∗)|c (21)
Imagine-se uma onda esférica que converge para a origem no instante t (FIGURA 3). A onda atinge antes a carga no instante retardado e a posição desta nesse instante é a sua posição retardada →r(t∗) — tal é o significado da equação (21).

São o instante e posição da carga quando emitiu a radiação que chega ao observador no instante t. Quando se olha para o Sol agora, observa-se onde estava cerca de 500 segundos antes. Mas haverá apenas um instante retardado para cada instante t de observação? Se houvesse dois ou mais, haveria duas ou mais imagens da mesma carga a chegarem ao observador naquele mesmo instante t, o que só seria possível se a carga tivesse viajado a velocidades superiores à da luz. Do mesmo modo, só poderia não existir instante retardado, i.e., não haver solução da equação (21), se a imaginada onda esférica nunca atingisse a carga, o que manifestamente significa que a carga viaja a velocidades superiores à da luz. Assim, a realização pela experiência comum de cada objecto ter uma e uma só imagem significa que só existe uma solução da equação (21). Da equação (21) deduz-se uma primeira aproximação para o instante retardado, admitindo que a velocidade da carga é muito menor que a velocidade da luz:
→r(t∗)≃→r(t)−→v(t)c|→r(t∗)|→|→r(t∗)|≃|→r(t)|−→r(t)⋅→v(t)c (22)
Assim, para velocidades da carga muito menores que a velocidade da luz, a distância à posição retardada é, praticamente, a distância à posição atual. Como tal, a equação (21) fica:
t∗=t−|→r(t)|c (23)
Doravante, a condição de baixas velocidades (v≪c) será assumida.
Interessa, aqui, considerar o campo eletromagnético gerado por uma carga em movimento em pontos muito afastados da região onde se move a carga. Assim, com uma origem de coordenadas escolhida dentro dessa região, tem-se R≈r, a distância da origem ao observador, e →eR≃→er, o versor que aponta dessa origem para o observador. Nestas condições, as equações (19) e (20) ficam:
→E(→r,t)=14πε0c2r→er∧[→er∧∫dV′∂→i(→r′,t−rc)∂t]=14πε0c2r→er∧[→er∧ddt∫dV′→i(→r′,t−rc)]
→B(→r,t)=14πε0c2→erc∧ddt∫dV′→i(→r′,t−rc)=→erc∧→E(→r,t)
Para uma corrente de transporte é →i=ρ→v, de modo que, para uma carga pontual, q, tem-se:
→E(→r,t)≃q4πε0c2r→er∧[→er∧→a(t−rc)] (24)
→B(→r,t)=→erc∧→E(→r,t) (25)
onde →a é a aceleração da carga. O campo elétrico é determinado pela aceleração transversal da carga, i.e., perpendicular à direção definida pela carga e o observador. Tal facto explica o ângulo de Brewster[6]: na ótica geométrica haveria um raio refletido naquela direção, mas os dipolos que constituem o meio dielétrico estão a vibrar exatamente naquela direção pelo que não há emissão nessa direção e, portanto, não há onda refletida.
Note-se que →E, →B, →er formam um triedro direto. Com estes resultados, obtém-se o fluxo de energia:
→S(→r,t)=ε0c2→E∧→B=ε0c|→E(→r,t)|2→er (26)
Estes resultados são válidos, apenas, dentro das hipóteses referidas (grandes distâncias de observação, cargas com baixas velocidades). A solução exata das equações de campo para uma carga pontual, designadas por equações de Liénard-Wichert, pode ser encontrada na bibliografia, no final deste artigo.
Os exemplos seguintes clarificam estes resultados.
1.º Oscilador harmónico.
A FIGURA 4 representa um oscilador harmónico unidimensional[7], um modelo simples para a emissão de radiação por dipólos elétricos moleculares. Com o eixo z na direção das oscilações, consideram-se coordenadas esféricas para identificar a posição do observador.

Designando por ω0 a frequência própria do oscilador, a sua posição em qualquer instante é:
z=z0cos(ω0t)
onde z0 é a amplitude da oscilação. Assim, a aceleração transversal para o observador é:
→aT=ω20z0cos(ω0t)sinθ→eθ
onde →eθ é o versor dirigido no sentido em que θ cresce. Usando a equação (24), o campo elétrico da onda radiada é:
→E(→r,t)≃−q4πε0c2r→aT(t−rc)=−q4πε0c2rω20z0sinθRe[e−iω0(t−rc)]→eθ
A onda recebida pelo observador está polarizada linearmente. Para um observador a grandes distâncias do oscilador, a superfície esférica da fase pode ser substituída pelo plano tangente, pelo que o factor de fase se escreve:
ω0(t−rc)=ω0t−→k⋅→r
com →k=ω0c→er o vetor de onda. Para o observador, trata-se de uma onda plana monocromática como foi já considerada em Ondas eletromagnéticas.
O fluxo de energia da radiação emitida é definido pelo vetor de Poynting, equação (26), obtendo- se para a intensidade (média do fluxo sobre um ciclo de oscilação:
I(θ)=r2⟨→S⋅→er⟩=ε0cr2⟨|→E|2⟩=ε0c2(q4πε0c2ω20z0sinθ)2 (27)
Esta intensidade é designada por dipolar, sendo preponderante no plano perpendicular às oscilações (FIGURA 5). A potência total emitida é:
δWδt=∫dΩI(θ)=q24πε0(ω20z0)23c3

Consequentemente, o oscilador perde energia e vai amortecendo as oscilações. A energia do oscilador é Eosc=12mω20z20, pelo que:
dEoscdt=−δWδt→dEoscdt−γEosc
onde a constante de amortecimento, γ, é:
γ=q24πε02ω203mc3→γω0=q24πε0(cω0)23mc2
A última expressão mostra que a razão γω0 é aproximadamente o quociente da energia potencial elétrica para uma distância da ordem do comprimento de onda (λ=2πcω0), pela energia em repouso do oscilador. Para a carga de um eletrão e para frequências no visível (ω0≈1014s−1), obtém-se γω0∼10−9.
Há um outro importante efeito que o amortecimento, qualquer que seja a sua natureza, introduz na radiação emitida pelo oscilador. Com efeito, a equação de movimento do oscilador dá:
d2zdt2+γdzdt+ω20z=0
Procurando soluções da forma e−iωt, encontram-se duas soluções complexas para ω:
ω±=−iγ2±√ω20−(γ2)2
O movimento genérico do oscilador é, pois, a sobreposição de duas oscilações amortecidas com a mesma frequência (a parte real de ω±). Para simplificar, admita-se que γ≪ω0; então, a solução da equação de movimento é:
z(t)=z0e−γt2cosω0t
A diminuição da amplitude processa-se muito lentamente: o oscilador efectua muitas vibrações com a frequência ω0 antes de diminuir ligeiramente a sua amplitude. Deste modo, pode-se tomar a média do fluxo de energia radiada para um ciclo de vibração, obtendo-se uma intensidade que decai exponencialmente no tempo:
I(t)=I0e−γt
onde I0 é a intensidade atrás deduzida. Esta constante de amortecimento, γ, aparece, também, como a largura da risca espectral de frequência ω0. Com efeito, a aceleração da carga:
a(t)=¨z≃−ω20z0e−γt2cos(ω0t)
não é mais monocromática. Um detetor, por exemplo, rede de difração[8] é sensível às diferentes frequências na decomposição de Fourier da radiação associada com esta aceleração. Ora:
ˆa(ω)=∫∞0dteiωta(t)=ω20z0iω−γ2ω20−ω2−iγω
A intensidade registada no detetor é proporcional a |ˆa(ω)|2:
|ˆa(ω)|2≃(ω20z0)2ω2(ω20−ω2)2+γ2ω2
A função da frequência no segundo membro, é conhecida por Lorentziana (FIGURA 6). Está concentrada nas vizinhanças da frequência natural do oscilador, apresentando uma largura γ. É, então, esta a largura da risca de frequência ω0 observada num espectroscópio.

Imagine-se agora que o oscilador é actuado por uma força externa originada por uma onda eletromagnética que sobre ele incida. A equação de movimento fica:
d2zdt2+γdzdt+ω20z=qEame−iωt
onde Ea é a amplitude do campo eléctrico da onda incidente. A resposta do oscilador a esta excitação é a solução particular da equação de movimento, apresentado a amplitude complexa:
z=qEam1ω20−ω2−iγω
Como consequência da aceleração assim induzida, o oscilador emite radiação dipolar com uma intensidade proporcional à média no tempo da aceleração:
I∝ω4(ω20−ω2)2+γ2ω2
onde Ia é a intensidade da onda incidente. Reencontra-se a Lorentziana: a intensidade radiada é máxima na ressonância. Na atmosfera, as moléculas comportam-se como osciladores sob acção da luz solar. As frequências próprias destas moléculas (azoto, oxigénio) são muito superiores às frequências na luz visível (essas frequências próprias estão associadas com as energias de fótões que a molécula pode absorver). Nestas condições (ω0≫ω), a intensidade radiada é proporcional à quarta potência da frequência (dispersão Rayleigh, FIGURA 7).

Com o Sol alto, a luz azul é muito mais difundida que a luz vermelha (a frequência do azul é quase 1,6 vezes maior que a do vermelho) — o céu é azul. Mais para Este, a radiação que lá chega já pouco azul ou amarelo contém pelo que o céu no ocaso é avermelhado.
2.º A instabilidade do átomo clássico de hidrogénio.
A FIGURA 8 representa um eletrão (carga −q, massa m) descrevendo um movimento circular (raio b) em torno de um prótão (carga q, massa M≫m) praticamente imóvel. Este seria o modelo clássico do átomo de hidrogénio.

A aceleração do eletrão é centrípeta, a=ω2b, sendo a frequência angular ω determinada pela lei fundamental da dinâmica:
mω2b=q24πε0b2→ω2b=q24πε0mb2
O campo eléctrico de radiação gerado pelo eletrão num ponto a grandes distâncias do átomo (r≫b) é:
→E(→r,t)=q4πε0c2r→aT
onde →aT é a aceleração transversal, i.e., perpendicular ao versor →er das coordenadas esféricas representadas na figura. Facilmente se encontra:
→aT=−ω2b[→eθcosθcos(ωt−ϕ)+→eϕsin(ωt−ϕ)]
O vetor de Poynting fica:
→S=ε0c|→E|2→er=ε0c(q4πε0c2r)2(ω2b)2[(cosθcos(ωt−ϕ))2+(sin(ωt−ϕ))2]→er
Efetuando a média para um período de revolução, obtém-se para a intensidade radiada naquela direção:
I(θ,ϕ)=ε0c(q4πε0c2)2(ω2b)2(1+(cosθ)2)
O fluxo de energia dá-se predominantemente na direção perpendicular ao plano do movimento. Assim, a potência total radiada é:
δWδt=∫dΩI(θ,ϕ)=ε0c2(q4πε0c2)2(ω2b)28π3=13q24πε0c3(ω2b)2
Note-se que esta também é, fundamentalmente, a energia radiada num acelerador circular de partículas, embora aí a velocidade das cargas seja próxima da velocidade da luz no vazio. Por tal motivo, esta radiação é designada por sincrotrónica. Com a aceleração da carga atrás deduzida, a potência radiada fica:
δWδt=c3b(q24πε0b)3(mc2)2
Considere-se b≃10−10m(1˙A) tal como se estima na teoria cinética dos gases. Então, para a carga do eletrão, é q24πε0b≃17eV, enquanto que mc2=5×105eV, obtendo-se δWδt≃2×1010eV/s. Ora, sendo b o raio da órbita, a energia do electrão no seu movimento é 12m(ωb)2−q24πε0b≃−8,5eV, pelo que em cerca de 10−9s o electrão cairia para o núcleo!
Este resultado era do conhecimento de J. J. Thomson quando, em 1897, descobriu o electrão e apresentou o primeiro modelo do átomo: eletrões em repouso numa esfera de prótões. O modelo seria descartado após as experiências de difusão de partículas alfa (núcleos de hélio) por Rutherford, onde se verificou existir um núcleo de raio 105 vezes menor que o raio do átomo. Rutherford recupera o modelo planetário do átomo, percebendo-se melhor a enorme audácia de N. Bohr quando, em 1913, postula que o eletrão se situa em órbitas estacionárias onde não radia, só aparecendo radiação quando o eletrão salta de uma dessas órbitas para outra de menor energia, emitindo então um fótão, o quantum da radiação.
3.º A difusão Thomson.
Imagine-se uma onda electromagnética plana e monocromática a incidir sobre uma carga elétrica livre. Escolhendo o eixo z com a direção do vetor de onda incidente, a carga movese no plano perpendicular, oscilando com a frequência da onda incidente e emitindo radiação com a mesma frequência, designada por difusão Thomson (1898). A aceleração é, simplesmente, →a=qm→Eae−iωt (ignora-se o efeito, muito menor, do campo magnético). Usando a geometria da FIGURA 8, encontra-se facilmente a intensidade da radiação emitida:
I(θ,ϕ)=εcc2(q24πε0mc2)2[(cosθ)2|Excosϕ+Eysinϕ|2+|Exsinϕ+Eycosϕ|2]
Para radiação incidente não polarizada, obtém-se:
I(θ,ϕ)=14(q2eπε0mc2)2[(cosθ)2+1]Iinc
onde Iinc é a intensidade da radiação incidente. A intensidade total radiada obtém-se por integração sobre o ângulo sólido:
I=∫dΩI=43(q24πε0mc2)2Iinc=4π3r2cIinc
onde rc é o raio clássico do eletrão. Recordar-se-á que I é a potência total difundida enquanto Iinc é a potência incidente na unidade de área.
A difusão Thomson é importante no estudo de plasmas ou em Cosmologia onde aparece sobreposta à radiação cósmica de fundo.
4.º Radiação emitia por um magneto em rotação.
Um pulsar é uma estrela de neutrões com a massa do Sol e o raio da Terra. É o que resta da explosão de uma supernova, rodando rapidamente (com períodos do milissegundo) e conservando um fortíssimo campo magnético cujo eixo não coincide com o eixo de rotação. Cargas elétricas, sobretudo eletrões, confinados pelo campo magnético, descrevem órbitas helicoidais em torno do eixo magnético, originando uma fortíssima radiação que atingirá a Terra se o planeta, por acaso, se encontrar na direção do feixe emitido. O movimento das cargas é semelhante ao que ocorre num solenóide gigante, podendo este ser modelizado por um magneto em rotação. Considere-se então a radiação emitida por uma magnetização →M definindo uma corrente →i=▽∧→M. Substituindo na equação (12), obtém-se:
→A(→r,t)≃μ04πr∫dV′(▽′∧→M(→r′,t′))t′=t−Rc
onde se usou a relação de Maxwell ε0μ0c2=1.
Procedendo como anteriormente, substitui-se o integrando pela identidade:
(▽′∧→M(→r′,t′))t′=t−Rc=▽′∧→M(→r′,t−Rc)+1c▽′R∧˙→M(→r′,t−Rc)=
=▽′∧˙→M(→r′,t−Rc)−→eRc∧˙→M(→r′,t−Rc)
Aqui, o ponto sobre a magnetização indica derivada em ordem ao tempo. O primeiro termo do último membro, substituído no integral, dá 0, pelo teorema de Gauss. Deste modo, obtém-se:
→A(→r,t)≃−μ04πrc∫dV′→eR∧˙→M(→r,t−Rc)≃−μ04πrc→er∧∫dV′˙→M(→r′,t−rc)=
=−μ04πrc→er∧˙→μ(→r′,t−rc)
onde se admitiu grande distância entre o magneto e o observador para se ter R≃r. Nesta expressão final, →μ é o momento magnético do sistema. O campo de radiação é agora facilmente deduzido a partir das equações (3) e (4):
→E(→r,t)=−∂→A∂t=μ04πrc→er∧¨→μ(→r′,t−rc)
→B(→r,t)=▽∧→A≃−μ04πrc▽∧[→er∧˙→μ(→r′,t−rc)]≃
≃μ04πrc2→er∧[→er∧¨→μ(→r′,t−rc)]=1c→er∧→E
O magneto roda com a velocidade angular →ω, pelo que ˙→μ=→ω∧→μ. Escrevendo o momento magnético como soma de uma componente paralela ao eixo de rotação, →μ||, e outra perpendicular àquele eixo, →μ⊥, é apenas esta que varia no tempo, tendo-se:
˙→μ⊥=→ω∧→μ⊥→¨→μ⊥=−ω2→μ⊥
Observe-se que |→μ⊥|=μsinα, onde α é o ângulo entre os eixos de rotação e magnético. O fluxo de energia radiada é obtido através do vetor de Poynting:
→S=→E∧→Bμ0=1μ0c|→E|2→er=μ0ω4(4πc)2c[→er∧(→er∧→μ⊥(t−rc))]2→err2
Note-se a proporcionalidade a ω[9] tal como na difusão Rayleigh. Para uma observação ao longo do eixo de rotação, a radiação tem polarização circular e para uma observação normal àquele eixo, a radiação apresenta polarização linear. Para outras latitudes, a polarização é elíptica.
A radiação emitida por um pulsar não só informa sobre a sua frequência de rotação como sobre o momento magnético efectivo e o ângulo que este faz com o eixo de rotação. A frequência de rotação é extremamente estável tornando os pulsares em relógios de grande precisão utilizados para navegação de sondas espaciais de longo curso.
Apêndice: Campo electromagnético gerado por carga pontual em movimento arbitrário.
Considere-se a FIGURA 3 onde →r(t) e →r designam respetivamente, a posição instantânea da carga e a posição do observador (imóvel), ambas referidas a uma origem de um sistema de eixos cartesianos arbitrário. A posição do observador em relação à carga é notada por →R≡→r−→r(t), definindo-se o versor →e(t)≡→R(r)R(t). O instante retardado, t∗ é determinado pela solução da equação t∗=t−R∗c, onde R∗=R(t∗) é a distância do observador à posição retardada da carga (doravante, o asterisco designa grandezas referidas ao instante retardado). Os potenciais de Liénard-Wichert são as soluções das equações de Maxwell para os potenciais eletromagnéticos gerados pela carga pontual:
φ(→r,t)=q4πε0R∗11−→v∗⋅→e∗c
→A(→r,t)=→v∗c2φ(→r,t)
Aqui, →v é a velocidade instantânea da carga. O potencial magnético, →A , é idêntico ao que se obteria para uma carga em movimento uniforme apenas tendo que se referir a velocidade ao instante retardado. O potencial eléctrico é o potencial de Coulomb calculado na posição retardada com uma correcção que o faz aproximar do seu valor na posição actual (veja-se a expressão aproximada para o tempo retardado, equação (22)).
As intensidades dos campos elétrico e magnético deduzem-se destes potenciais usando as equações (3) e (4). O cálculo é bastante extenso não sendo aqui reproduzido, remetendo-se o leitor interessado para a bibliografia sugerida. O resultado final é:
4πε0q→E(→r,t)=1R∗21(1−→v∗⋅→e∗c)3[(→e∗−→v∗c)(1−v∗2c2)+R∗c2→e∗∧((→e∗−→v∗c)∧→a∗)]
→B(→r,t)=→e∗c2∧→E(→r,t)
onde →a é a aceleração da carga.
O campo elétrico é a soma de um campo de Coulomb, variando como R∗−2, corrigido por termos que só dependem da velocidade, com o campo de radiação, variando como R∗−1. Para baixas velocidades da carga, v≪c, o campo de radiação reduz-se à equação (24).
[editar] Referências
- ↑ LAGE, E., Ondas electromagnética, Rev. Ciência Elem., V9(2):048. (2021). DOI: 10.24927/rce2021.048.
- ↑ LAGE, E., Gradiente, divergência e rotacional, Rev. Ciência Elem., V8(2):029. (2020). DOI: 10.24927/rce2020.029.
- ↑ LAGE, E., Campos (Física), Rev. Ciência Elem., V6(2):039. (2018). DOI: 10.24927/rce2018.039.
- ↑ LAGE, E., Ondas electromagnética, Rev. Ciência Elem., V9(2):048. (2021). DOI: 10.24927/rce2021.048.
- ↑ LAGE, E., Os fundamentos do Eletromagnetismo, Rev. Ciência Elem., V9(1):016. (2021). DOI: 10.24927/rce2021.016.
- ↑ LAGE, E., As equações de Fresnel, Rev. Ciência Elem., V11(1):000. (2023).
- ↑ LAGE, E., O oscilador harmónico, Rev. Ciência Elem., V7(2):033. (2019). DOI: 10.24927/rce2019.033.
- ↑ LAGE, E., Ondas, Rev. Ciência Elem., V8(1):016. (2020). DOI: 10.24927/rce2020.016.
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Criada em 26 de Abril de 2022
Revista em 14 de Junho de 2022
Aceite pelo editor em 15 de Março de 2023