Pêndulo de Foucault
Referência : Lage, E., (2018) Pêndulo de Foucault, Rev. Ciência Elem., V6(3):069
Autores: Eduardo Lage
Editor: José Ferreira Gomes
DOI: [http://doi.org/10.24927/rce2018.069]
Qual o efeito da rotação da Terra no movimento de um pêndulo simples? Esta questão foi, primeiramente, considerada pelo físico francês Jean Bernard Léon Foucault (FIGURA 1A). Para isso, construiu, em 1851, um pêndulo com fio de 67m de comprimento na extremidade do qual colocou uma massa esférica de 30Kg, assegurando, dessa forma, um grande período de oscilação (cerca de 16s) e um fraco amortecimento devido à resistência do ar (FIGURA 1B). Colocado a oscilar, com uma pequena amplitude, verifica-se que o plano de oscilação do pêndulo roda lentamente, demonstrando, dessa forma, a rotação da Terra. O pêndulo de Foucault, como passou a ser designado, causou, na época, enorme sensação e é hoje um instrumento obrigatório em qualquer museu de ciência.
Como se justifica esta rotação do plano do pêndulo? Para um observador terrestre, somos obrigados a considerar as forças inerciais e, destas, a única que aqui importa é a força de Coriolis [1]:
\(\vec{F}_c=-2m \ \vec{\omega}_T \ \times \vec{v}\)
FIGURA 1. A- Léon Foucault selo comemorativo. B- Pêndulo de Foucault no Pantheón de Paris.
onde \(\vec{\omega}_T\) é o vetor rotação instantânea da Terra. Vemos já, embora qualitativamente, que o plano de oscilação de um pêndulo não é mais invariante: a força de Coriolis, perpendicular à velocidade, obriga este plano a rodar.
Procedamos à análise quantitativa, um pouco simplificada, considerando o caso habitual de pequenas oscilações, o
que nos irá garantir que o fio permanece tenso. Nestas condições, o movimento do pêndulo situa-se, praticamente,
no plano horizontal, onde escolhemos eixos \(x\), tangente o paralelo dirigido para Este, e \(y\), tangente ao
meridiano dirigido para Norte (FIGURA 2). São ambos, evidentemente, perpendiculares entre si e também
perpendiculares ao eixo vertical z. Será evidente que apenas a componente vertical de \(\vec{\omega}_T\), é
responsável pela rotação do plano de oscilação. Se não houvesse a força de Coriolis, o movimento do pêndulo
seria o
de um oscilador harmónico, como se viu noutra publicação, o que significa que estaria, apenas, submetido à força
\(-m\omega_0^2\vec{r}\), onde \(\omega _0-{\sqrt {g/l}} \) sendo \(l\) o comprimento do pêndulo. Pela
consideração anterior, a força de Coriolis fica reduzida ao termo \(-2m\omega_t \ sen\lambda \
\vec{e_z}\times\vec{v}\), onde \(\lambda\) é a latitude do lugar. Assim, as equações de movimento no plano
horizontal, são:
\(m\frac{d^2x}{dt^2}=-m\omega_0^2x+2m\omega_T \ sen\lambda\frac{dy}{dt}\)
\(m\frac{d^2y}{dt^2}=-m\omega_0^2y+2m\omega_T \ sen\lambda\frac{dx}{dt}\)
É útil, aqui, introduzir o complexo \(w = x + iy\). Obtem-se:
\(\frac{d^2w}{dt^2}+\omega_0^2w+2i\omega_T \ sen\lambda\frac{dw}{dt}=0\)
É uma equação linear, pelo que se procuram soluções da forma \(w \sim e^{i\omega t}\), vindo:
\(-\omega^2+\omega_0^2-2\omega \ \omega_T \ sen\lambda= 0\)
Na situação habitual, é \(\omega_0 \gg \omega_T\), resultando:
\(\omega = \mp \ \omega_0-\omega_T \ sen\lambda\)
Deste modo, a solução geral para \(w(t)\) é:
\(w(t) =e^{-it\omega_T \ sen\lambda}(A e^{-it\omega_0}+Be^{-it\omega_0})\)
onde \(A\) e \(B\) são constantes, complexas, determinadas pelas condições iniciais. Suponhamos, então, que estas condições são \(w(0)=w_0\equiv a+ib\) e \(w\cdot(0)=0\), isto é, o pêndulo é largado na posição genérica \(x = a\) e \(y = b\), com velocidade nula. Obtem-se, assim:
\(A=\frac{\omega_0+\omega_T\ sen\lambda}{2\omega_0}\cong\frac{1}{2}\ \ \ \ \ B= \frac{\omega_0-\omega_T\ sen\lambda}{2\omega_0}\cong\frac{1}{2}\)
Substituindo na expressão anterior para \(w(t)\), resulta:
\(w(t) =e^{-it\omega_T \ sen\lambda} \ w_0 \ cos (\omega_0t)\)
Se \(\omega_T=0\), este complexo tem sempre a direção de \(w_0\), i.e, a trajetória seria sempre um segmento de reta, o que corresponde ao plano invariante do pêndulo. Mas com \(\omega_T>0\), a fase do complexo cresce linearmente no tempo, i.e., a trajetória roda, no sentido contrário ao dos ponteiros de um relógio, o que corresponde à rotação do plano do pêndulo, como se mostra na FIGURA 3.
Tem interesse, neste contexto, analisar o valor de \(ω_T\). Como a Terra efetua uma rotação completa em 24h, poder-se-ia pensar que \(ω_T\approx\frac{2\pi}{24\times3600}s^{-1}\).Mas não é assim! Com efeito, um dia, i.e., 24 h é o tempo que decorre, para um observador na Terra, para o mesmo ponto do planeta se encontrar alinhado com o Sol. Mas, durante esse tempo, a Terra também se deslocou no seu movimento de translação em torno do Sol, que também é uma rotação. Para simplificar, aceitemos que este movimento é circular uniforme, realizando-se no mesmo sentido que a rotação da Terra (FIGURA 4). Então, ao fim de 24 h, a Terra rodou um pouco mais que \(2\pi\) e este excesso acumula-se exatamente em \(2\pi\) ao fim de um ano, quando a Terra regressa à sua posição inicial. Quer dizer, para um observador no Sol, considerado como observador inercial para quem \(\omega_T\) é definido, a Terra rodou 366 vezes no tempo correspondente a 365 dias terrestres, i.e., \(\frac{366}{365}\) vezes po dia terrestre, pelo que:
\(\omega_T\approx\frac{2\pi}{24\times3600}\times\frac{366}{365}s^{-1}\approx 7.3 \times 10^{-5} \ s^{-1}\)
1 Com efeito, a rotação da Terra pode ser considerada uniforme e com eixo fixo em escalas de tempo da ordem de milhares de anos; os outros termos das forças inerciais, exceto Coriolis) adicionam a força centrífuga à força da gravidade, originando a definição de \(\vec{g}\) e a sua dependência na latitude.
Referências
- ↑ Com efeito, a rotação da Terra pode ser considerada uniforme e com eixo fixo em escalas de tempo da ordem de milhares de anos; os outros termos das forças inerciais, exceto Coriolis) adicionam a força centrífuga à força da gravidade, originando a definição de \(\vec{g}\) e a sua dependência na latitude.
Notas
- GOLDSTEIN, H. et al., Classical Mechanics, Addison Wesley 3ª edição, 2001.
- FEYNMAN, R.P. et al., The Feynman Lectures on Physics. San Francisco: Pearson/Addison-Wesley ,Vol. 1, section 12-5, 2006. ISBN 0-8053-9049-9
- LANDAU, L.D. e LIFSHITZ, E.M., Mechanics. Course of Theoretical Physics. Vol. 1 (3rd ed.). Butterworth-Heinenan, pp. 128-130, 1976.
Recursos relacionados disponíveis na Casa das Ciências:
Criada em 24 de Abril de 2018
Revista em 22 de Setembro de 2018
Aceite pelo editor em 4 de Outubro de 2018