Migração assistida numa planta em perigo

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Referência : Pinto, M. J., (2019) Migração assistida numa planta em perigo, Rev. Ciência Elem., V7(3):043
Autor: Manuel João Pinto
Editor: José Ferreira Gomes
DOI: [http://doi.org/10.24927/rce2019.043]
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Quando as condicionantes ambientais favoráveis à sobrevivência são limitadas e as espécies se encontram em risco de se extinguirem, uma das estratégias mais importantes para a sua salvaguarda é a migração assistida.


Esta estratégia visa a colonização de áreas com habitat adequado, ultrapassando barreiras geográficas e distâncias que seriam inultrapassáveis em tempo útil devido à pequena capacidade dispersiva e reduzida dimensão de algumas populações silvestres. Sem esta ajuda, estas espécies críticas das quais se destaca Plantago almogravensis, estariam extintas em breve dada a sua elevada vulnerabilidade.

A migração assistida consiste no movimento intencional de indivíduos de populações selvagens para outros locais adequados mas distantes, cessando esta “ajuda” a partir do momento em que estes organismos são libertos. Nestes novos locais é esperado que a sobrevivência e a regeneração natural da nova população formada superem a mortalidade garantindo longevidade. Uma vez que não prevalecem fatores de domesticação, e reconhecendo as diferenças de habitat que naturalmente sempre se registam entre as duas regiões geográficas, é também esperado que esta nova população que foi assistida na sua dispersão possa contribuir para a diversidade fenotípica e genética dominantes no conjunto de populações da espécie (FIGURA 1).

Plantago almogravensis Franco, é uma planta que atualmente coloniza habitats costeiros do sudoeste de Portugal continental de onde é endémica muito restrita, devido à sua diminuta área de distribuição inferior a 1 ha (cerca de um campo de futebol). Esta pequena planta produtora de flores e sementes - espermatófita hermafrodita - ocorria até à década de setenta do século XX em diversos locais daquela região no Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina. Foi-se extinguindo nestes locais, nomeadamente devido à perda de habitat resultante da atividade transformadora humana, até se concentrar numa única zona, também esta sujeita e diversas pressões humanas que nem o estatuto territorial de Área de Proteção Integral tem conseguido suster.


FIGURA 1. Um indivíduo de Plantago almogravensis Franco
na população-doadora.

Em face da iminente extinção, o Instituto de Conservação da Natureza (ICN) levou a cabo em 2006, uma operação de translocação de 8 indivíduos reprodutores para um novo local situado cerca de 15km a Sul da população-doadora (figura 2). Este novo núcleo tem sido monitorizado, registando-se taxas de crescimento populacional equivalentes ou ligeiramente acima da média.

Conclui-se, portanto, o êxito da operação, sobretudo pelo facto da nova população contribuir estrategicamente para a diversificação de locais colonizados espacialmente disjuntos, reduzindo assim o risco de extinção devido a toda a população ter estado concentrada numa única localidade. Contudo, decorridos 12 anos, mantém-se bastante pequena a dimensão desta população que é suportada pela elevada longevidade dos indivíduos, mas que também revela um lento crescimento demográfico, estando por isso exposta a síndromes prováveis nas pequenas populações, deriva genética, consanguinidade e estocacidade ambiental e biológica, não sendo verossímil que esta possa constituir uma população mínima viável (MVP). A viabilidade de uma população é um conceito-alvo que normalmente se procura avaliar sobretudo em populações frágeis, resultantes de programas de conservação e salvaguarda. Nas considerações originais do conceito, uma população-MVP deveria garantir uma sobrevivência de pelo menos 80% dos indivíduos no período de 20 anos. Em face do reduzido crescimento e aproximando-se o limiar de longevidade dos indivíduos-fundadores, será provável que o percurso populacional decline paulatinamente nos próximos anos, mesmo que não incidam ações humanas negativas. Questiona-se então que caminho prosseguir? A extinção biológica é um fenómeno que documentadamente tem atravessado milénios e é por isso expectável, mas hoje o Planeta está a perder espécies a um ritmo ímpar e galopante, suscitando grandes preocupações sobre a estabilidade dos elos existentes entre a Biodiversidade e a sustentabilidade ambiental. Por isso o caminho a prosseguir deverá ser indubitavelmente o de evitar a extinção e assegurar a continuidade desta planta, dando continuidade ao programa de migração assistida e usando conhecimentos recentes sobre o habitat desta espécie, sugerindo que poderá ser translocada para ambientes severos para a generalidade das plantas e residuais para as sociedades humanas como são as escombreiras mineiras.


FIGURA 2. Panorâmica fotográfica em 2013 do habitat da população fundada por migração assistida. Revelam-se em A)
os canais de acumulação coluvial que constituem o habitat principal da espécie, B)
os taludes de encouraçamentos ferruginosos com abundante Fe e Al, C) os matos costeiros.

Na verdade este plantago é uma planta metalófita, capaz de tolerar elevadas concentrações de metais no local de enraizamento, cujas concentrações atingem facilmente níveis de toxicidade letais para a generalidade das espécies vegetais, favorecendo o balanço de competitividade ecológica necessário.



BIBLIOGRAFIA

  1. Instituto da Conservação da Natureza -ICN, Plano Nacional de Conservação da Flora em Perigo (1.ªFase)., Relatório final do projecto LIFE – Natureza III P\8480. Relatório não publicado. ICN, Lisboa. 2007. 65pp
  2. IUCN Species Survival Commission, IUCN - Guidelines for Reintroductions and Other Conservation Translocations., August 2012. Adopted by SSC Steering Committee at Meeting SC 4 6, 5 th September 2012.
  3. Pinto, M.J. et al. Éxito en la translocación de una planta con restricciones dispersivas.Conservación Vegetal, 17: 8-9. 2013.
  4. Serrano, H.C. et al. How does an Al-hyperaccumulator plant respond to a natural field gradient of soil phytoavailable Al?Science of the Total Environment, 409: 3749-3756. 2011.
  5. Shaffer, M.L. Minimum population sizes for species conservation. BioScience, 31: 131–134. 1981.




Criada em 31 de Maio de 2019
Revista em 3 de Junho de 2019
Aceite pelo editor em 16 de Outubro de 2019