Diferenças entre edições de "Geoparques e Parques Geológicos"
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Revisão das 13h41min de 22 de outubro de 2021
Referência : Pimentel, N., (2021) Geoparques e Parques Geológicos, Rev. Ciência Elem., V9(3):054
Autor: Nuno Pimentel
Editor: João Nuno Tavares
DOI: [https://doi.org/10.24927/rce2021.054]
Resumo
Já todos ouvimos falar de Parques Geológicos e também, mais recentemente, de Geoparques. Embora pareçam iguais na sua semântica, com os mesmos dois termos a aparecerem separados ou aglutinados, na realidade são dois conceitos muito distintos. Importa por isso descobrir as diferenças e perceber “quem é quem” nesta coisa dos parques, em que a Geologia é claramente a rainha e nós (os visitantes) os seus consortes.
Os Parques Geológicos são em geral Parques Naturais em que a Geologia desempenha um papel primordial no seu interesse e atratividade. Embora haja dezenas de parques geológicos nos EUA, na Europa e na Ásia, os exemplos mais paradigmáticos são os grandes parques nacionais dos Estados Unidos da América, como o Grand Canyon, Yellowstone ou a Petrified Forest. No Grand Canyon, certamente o mais famoso e visitado parque dos EUA, a grande estrela é a sua Geomorfologia, com o espetacular encaixe do Rio Colorado - o vale fluvial atravessa e expõe centenas de metros de rochas que nos mostram a história geológica da região, desde as rochas ígneas e metamórficas mais antigas e deformadas (com mais de 1.000 milhões de anos), até às camadas sedimentares tabulares mais recentes (com cerca de 275 milhões de anos). No Yellowstone, os fenómenos geológicos relacionados com a presença de uma câmara magmática próxima da superfície são responsáveis pela maior concentração (mais de 50%) dos geysers ativos em todo o mundo. Na Petrified Forest, como o nome indica, são os inúmeros troncos fossilizados (silicificados) de grandes árvores com mais de 200 milhões de anos, o principal motivo de interesse daquele parque.
Nestes e em vários outros Parques Nacionais dos EUA, a Geologia foi claramente o fator-chave para a sua criação. Mas outros aspetos como a Natureza (englobando as paisagens geológicas, a fauna e a flora) e a Cultura, são também frequentemente valorizados e podem ser explorados pelos visitantes. Ainda assim, a dinamização destes parques centra-se no usufruto desses valores naturais por si mesmos, através de visitas guiadas, excursões, passeios, atividades educativas, etc.. Por outras palavras, o território é entendido como um conjunto de valores naturais e culturais para serem olhados e apreciados pelos visitantes que vêm de fora, como se de um museu (um bom museu, dinâmico e ativo) se tratasse… mas ao ar livre!
Os Geoparques são um conceito lançado em 2001 pela Organização de Educação, Ciência e Cultura das Nações Unidas (UNESCO). Em 2014, 17 Geoparques europeus e 8 chineses fundaram a Rede Global de Geoparques da UNESCO (UGGN), que rapidamente foi crescendo com novas adesões, atingindo em 2021 o número de 169 distribuídos por 44 países. Cerca de metade encontra-se na Europa, com 81 territórios distribuídos por 26 países, destacando-se a Espanha com 15 e a Itália com 11, enquanto Portugal tem neste momento 5 Geoparques mundiais e 3 aspirantes, de que falaremos adiante.
Segundo a definição da própria UNESCO, os Geoparques Globais da UNESCO (UGG) são áreas geográficas singulares onde locais e paisagens de importância geológica internacional são geridas com base num conceito holístico de proteção, educação e desenvolvimento sustentável. Cada UGG compreende uma série de locais com património geológico de especial importância científica, raridade ou beleza, representativos da história geológica de uma região e dos eventos e processos que a formaram, devendo também incluir património natural, histórico e cultural tangível ou imaterial. Como se pode desde logo entender, o âmbito dos geoparques não se cinge à sua Geologia, procurando olhar para além dela, para o território na sua integralidade, como instrumento educativo e de desenvolvimento regional.
Para a UNESCO, a Geologia é “apenas” o ponto de partida de um Geoparque, não o seu ponto de chegada. É com base na existência de aspetos geológicos ímpares e de relevância internacional, avaliada e atestada por especialistas externos, que cada Geoparque deverá procurar a sua estratégia de desenvolvimento local. Este é, portanto, um processo eminentemente bottom-up, ou seja, um processo que parte das entidades locais e das chamadas “forças vivas da região”, para construir uma ideia de “território”, com identidade geológica, natural e patrimonial própria. E só então, a partir daí, deverá lançar-se para uma abordagem holística, em que todos os valores desse território possam contribuir, de forma articulada e harmoniosa, para o desenvolvimento sustentável da região.
Tal como os Parques Geológicos, os Geoparques têm como “âncora” a existência de elementos geológicos únicos e de relevância nacional ou internacional. Mas um Geoparque implica uma estratégia de longo prazo, assente em três pilares essenciais: a Geoconservação, a Geoeducação e o Geoturismo. A Geoconservação consiste na identificação, caracterização, preservação e usufruto dos principais elementos geológicos do território - os chamados Geosítios. A Geoeducação consiste em desenvolver atividades junto do público escolar e da população em geral, acerca do valor, importância e significado desses Geosítios, mas também de todo o outro património natural e cultural da região. Finalmente, o Geoturismo consiste na promoção da visitação e estadia dos visitantes locais, nacionais e estrangeiros, direcionada para o usufruto natural desse património. A integração destes três pilares assegura que o território tem um desenvolvimento equilibrado, usando os seus valores endógenos e promovendo a sustentabilidade.
Portugal tem neste momento 5 Geoparques já reconhecidos pela UNESCO: Naturtejo, Arouca, Açores, Terra de Cavaleiros e Estrela. Cada um destes geoparques tem características muito próprias, contando a todos os visitantes uma parte da história do nosso planeta. No Naturtejo, o forte contexto paisagístico da Meseta meridional enquadra o Monumento Natural das Portas do Ródão e contém o Parque Icnológico de Penha Garcia. Em Arouca, nas rochas metamórficas paleozoicas encontramos as famosas trilobites gigantes e nos granitos da Serra da Freita as peculiares “pedras parideiras”. Em Terras de Cavaleiros percorremos centenas de milhões de anos de geohistória em rochas que nos falam de antigos oceanos e nos mostram uma “janela” para o Manto terrestre. Nos Açores encontramos evidências paisagísticas e geológicas dos processos vulcânicos antigos e recentes, nas nove ilhas e também no fundo marinho entre elas. Na Estrela, o glaciarismo, com os seus processos, formas e depósitos característicos, é o cerne temático deste geoparque, a par das suas extensas paisagens e elevada biodiversidade.
Na calha estão já outros territórios “aspirantes” a Geoparques UNESCO. No aspirante Geoparque Oeste (entre Torres Vedras, Montejunto e as Caldas da Rainha) destaca-se a riqueza em fósseis de dinossauros do Jurássico e o GSSP (Global Boundary Stratotype Section and Point) que marca universalmente o início do Toarciano, para além do excelente registo geológico das sucessivas etapas de abertura do Atlântico Norte. No aspirante Geoparque Algarvensis, a descoberta de uma jazida muito rica em fósseis do Triásico superior, contendo o crânio de um Metaposaurus algarvensis, serviu de mote para o seu lançamento, acompanhado de muitos outros pontos de interesse geológico no barrocal algarvio, incluindo a mina de sal-gema de Loulé. No aspirante Geoparque Litoral de Viana do Castelo, complementam-se as rochas paleozoicas que nos falam do antigo oceano Rheic, com os vestígios mais recentes da evolução da orla costeira do Atlântico. Por fim, o projeto de um futuro Geoparque Atlântico (entre a Figueira da Foz e Penacova) foi lançado em 2021 para valorizar um registo geológico com mais de 500 milhões de anos, desde antigas cadeias montanhosas arrasadas até à abertura do oceano Atlântico.
Para terminar esta nota, numa Revista direcionada essencialmente para os docentes e alunos do ensino pré-universitário, importará abordar a importância dos geoparques na educação formal e informal da população. Considera-se que o contacto com os espaços naturais, englobando a Geologia com a Biologia e também com a História e Geografia, tal como é preconizado nos geoparques, é essencial para uma educação, e até mesmo para uma cidadania, integrais. Esta é uma abordagem que urge implementar, no sentido de ligar as populações, em particular as estudantis, ao espaço real e natural que as rodeia. Levar os alunos a sair e a olhar para o território, a paisagem, as rochas e toda a vida (vegetal, animal e humana) que elas suportam, é fundamental neste século tecnológico, mas também ecológico. Os Geoparques pretendem assim contribuir para este desígnio, ao mesmo tempo que promovem o desenvolvimento sustentável do território e das populações que nele habitam e trabalham.
Geoparques (e aspirantes) em Portugal
https://www.azoresgeopark.com/.
https://www.geoparkterrasdecavaleiros.com/.
https://www.geoparkestrela.pt/.
https://www.geoparqueoeste.com/.
https://geoparquealgarvensis.pt/.
https://www.geoparquelitoralviana.pt/.
UGG - Geoparques Globais UNESCO
Parques Nacionais nos E.U.A
Referências
Criada em 17 de Junho de 2021
Revista em 18 de Junho de 2021
Aceite pelo editor em 15 de Outubro de 2021