Xerofitismo e suculência

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Referência : Santos, T. V. A., Chaves, B. E., Oliveira, F. M. C., (2021) Xerofitismo e suculência, Rev. Ciência Elem., V9(2):043
Autor: Thaíla Vieira Alves dos Santos, Bruno Edson-Chaves e Fernanda Mª Cordeiro de Oliveira
Editor: José Ferreira Gomes
DOI: [https://doi.org/10.24927/rce2021.043]
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[editar] Resumo

As xerófitas são um subgrupo de plantas, que sobrevivem a ambientes com restrição de água, que pode ser ocasionada por um ou mais dos seguintes fatores: alta incidência de luminosidade e escassez de água. Perante tais condições ambientais estressantes espécies com características morfológicas e anatômicas específicas, como a redução da lâmina foliar, estômatos em criptas, abundâncias de tricomas, presença cutícula espessa nas folhas, assim como parênquima aquífero, são mais suscetíveis ao sucesso. Entre essas características a presença de tecido de reserva aquífero é marcante em plantas comumente conhecidas como “suculentas” pela sua textura sumosa, frequentemente encontrada nos órgãos aéreos.


Durante o processo evolutivo, as plantas encontraram diversas maneiras para sobreviver às grandes variações ambientais, algumas espécies estão sujeitas à condições de alagamento (hidrófitas) ou a solos moderadamente úmidos, com escassez de água ocasional e moderada (mesófitas)[1]. Outras, por sua vez, sobreviverem em regiões com temperaturas altas, com seca frequente e prolongada, além de solo usualmente pobre em matéria orgânica (xerófitas)[2].

O conceito de xerofitismo e xerófita foi introduzido pela primeira vez por Schouw, em 1822, se referindo a plantas de ambientes áridos (FIGURA 1), para sobreviver a estes ambientes tais plantas apresentam uma série de adaptações que permitem sobrevivência em escassez de água[3], [4]. É importante ressaltar que características morfológicas de adaptação à seca podem ser causadas pela falta de água (xeromorfismo) ou por deficiências nutricionais (escleromorfismo oligotrófico). E mesmo plantas de ambientes de matas mais úmidos, também podem apresentar certas características xeromórficas para sobreviverem aos diferentes nichos ecológicos existentes[5].

Quanto às estratégias de vida, as plantas xerófitas podem ter dois tipos principais: (i) fuga à seca, ou seja, são plantas anuais e efêmeras e completam seu ciclo de vida durante a estação chuvosa; e (ii) resistência à seca, tolerando esta condição ambiental em baixos níveis de potencial hídrico[6]. As plantas tolerantes apresentam uma série de características morfo-anatômicas para sobreviver às condições de aridez, dentre elas podem ser citadas: (i) estruturas subterrâneas - presença de tubérculos ou xilopódios, que apresentam tecidos armazenadores de água; e (ii) estruturas foliares - redução da lâmina foliar; pubescência; presença de cera; cutícula foliar espessa; várias camadas de parênquima paliçádico; esclerênquima desenvolvido; estômatos em cripta; hipoderme e parênquima aquífero (FIGURA 2)[7], [8]; além de parede celular espessa (especialmente na epiderme), alta relação superfície- volume e pequeno volume de espaços intercelulares, gerando compactação do mesofilo[9].


FIGURA 1. Ambiente árido, Bioma Caatinga, Brasil.

Entre as características citadas, a suculência é considerada uma adaptação morfológica à seca regular[10]. Este termo foi utilizado pela primeira vez como terminologia científica no final do séc. XIX, para se referir a tecidos vegetais armazenadores de água[11]. Etimologicamente vem do latim Succus que significa suco, referindo-se ao acúmulo de água em seus tecidos; a água armazenada é utilizada principalmente nos períodos de seca[12].


FIGURA 2. Características morfo-anatômicas de xerófitas. A) Redução da lâmina foliar e pubescência - Cactaceae. B) Tricomas peltados (seta) e em detalhe (inset) - Bromeliaceae. C) Cutícula foliar espessa (seta) e múltiplas camadas de parênquima paliçádico ({) - Myrtaceae. D) Estômatos em cripta (seta) - Apocynaceae; E) Hipoderme (seta) e parênquima aquífero-Bromeliaceae; F) Parênquima aquífero - Portulacaceae. PP= Parênquima paliçádico; PA= Parênquima aquífero.

Esse tecido, denominado de parênquima aquífero (hidrênquima), é normalmente composto por células parenquimáticas, de paredes finas (mas que normalmente possuem barras espessas de celulose, lignificadas ou não, que fornecem sustentação), geralmente desprovidas de cloroplastos, frequentemente ricas em mucilagem[13] e que contém um vacúolo que ocupa até 95% do volume celular[14]. O vacúolo tem um importante papel em manter a pressão de turgescência e a rigidez do tecido, além de ser um local de armazenamento para metabólitos[15] e proporcionar um ambiente propício para processos fotossintetizantes dos tipos C4 e CAM[16]. Outra adaptação, que ocorre em algumas espécies que possuem folhas enterradas é que a porção que não se encontra abaixo do solo possua presença de “janelas” formadas por tecidos translúcidos (prolongamento do parênquima aquífero) que deixam a luz solar passar, protegendo os tecidos delicados de raios ultravioletas ao mesmo tempo que permite a passagem de luz para os tecidos fotossintetizantes[17].

Atualmente, para classificar uma planta como suculenta é preciso avaliar três requisitos básicos que precisam ser cumpridos: armazenar água em tecido vivo; esta água deve estar disponível para a planta; além de poder manter alguma atividade metabólica, independente do suprimento externo de água[18]. Se seguirmos esses três critérios, a suculência surgiu de forma independente pelo menos 32 vezes no reino vegetal, em 83 famílias e 12.500 espécies (FIGURA 3)[19]. Podemos destacar famílias que apresentam um número significativo de representantes suculentos como, Aizoaceae, Apocynaceae, Asphodelaceae, Cactaceae, Crassulaceae e Euphorbiaceae[20].


FIGURA 3. Plantas suculentas A) Senecio sp. - Asteraceae. B) Agapanthus sp. - Amaryllidaceae. C) Stapelia sp.- Apocynaceae. D) Aloe sp. - Asphodelaceae. E) Neoregelia sp. - Bromeliaceae F) Opuntia sp. - Cactaceae G) Sedum sp. - Crassulaceae H) Euphorbia sp. - Euphorbiaceae.

Essa suculência pode ter surgido como uma estratégia para contornar o problema de raízes pouco profundas para captação de água de plantas tolerantes à seca[21].

[editar] Referências

  1. GUREVITCH, J. et al., Ecologia vegetal, Porto Alegre: Artmed. 2009.
  2. FAHN, A. & CUTLER, D., Xerophytes, ed. Gebru?der Borntraeger, Berlin. 1992.
  3. OPPENHEIMER, H. R., L’adaptation à la sècherese: Le Xérophytisme, UNESCO NS/AZ/415. 1959.
  4. FERRI, M. G., Evolução do conceito de xerofitismo, Ciências e Letras, Universidade de São Paulo. Botânica. 19:103. 1963.
  5. FERRI, M. G., Evolução do conceito de xerofitismo, Ciências e Letras, Universidade de São Paulo. Botânica. 19:103. 1963.
  6. PRISCO, J. T., Possibilidades de exploração de lavouras xerófilas no semi-árido brasileiro, Pesquisa Agropecuária Brasileira, 21 (4), 333-342. 1986.
  7. FAHN, A. & CUTLER, D., Xerophytes, ed. Gebru?der Borntraeger, Berlin. 1992.
  8. FERRI, M. G., Evolução do conceito de xerofitismo, Ciências e Letras, Universidade de São Paulo. Botânica. 19:103. 1963.
  9. ESAÚ, K., Anatomia das plantas com semente, São Paulo: Blucher. 1974.
  10. OLWEN, M. G., Succulent plant diversity as natural capital, Plants, People, Planet. 1:336–345. DOI: 10.1002/ppp3.25. 2019.
  11. NYFFELER, R. & EGGLI, U., An up-to-date familial and suprafamilial classification of succulent plants, Bradleya, 28, 125–144. 2010.
  12. INFANTE, G. P., Estado actual de las Suculentas en el Perú, Zonas áridas, 10, 155-173. 2006.
  13. SCATENA, V. L. & SCREMIN-DIAS, E., Parênquima, colênquima e Esclerêncquima, In: Appezato-da-Glória, B. & Carmello- Guerreiro, S. Anatomia Vegetal. 2 ed. Viçosa: EdUFV. 2006.
  14. GIBSON, A. C. Structure-function relations of warm desert plants, Berlin, Germany: Springer. 1996.
  15. EVERT, R. F., & EICCHORN, S. E., Raven biology of plants, 8th ed. New York, NY, USA: W.H. Freeman. 2013.
  16. SCHULTE, P. J., & NOBEL, P. S., Responses of a CAM plant to drought and rainfall: Capacitance and osmotic pressure influences on water movement, Journal of Experimental Botany, 40, 61–70. 1989.
  17. INFANTE, G. P., Estado actual de las Suculentas en el Perú, Zonas áridas, 10, 155-173. 2006.
  18. NYFFELER, R. & EGGLI, U., An up-to-date familial and suprafamilial classification of succulent plants, Bradleya, 28, 125–144. 2010.
  19. NYFFELER, R. & EGGLI, U., An up-to-date familial and suprafamilial classification of succulent plants, Bradleya, 28, 125–144. 2010.
  20. ARAKAKI, M. et al., Contemporaneous and recent radiations of the world’s major succulent plant lineages, Proceedings of the National Academy of Sciences, 108(20): 8379–8384. 2011.
  21. LANZANO, E. D. et al., Herbáceas do Sub-bosque, VIII Botânica no Inverno. São Paulo: Instituto de Biociências da USP. 2018.


Criada em 16 de Dezembro de 2020
Revista em 20 de Abril de 2021
Aceite pelo editor em 15 de Junho de 2021