Campo magnético estacionário

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Referência : Lage, E., (2021) Campo magnético estacionário, Rev. Ciência Elem., V9(1):019
Autor: Eduardo Lage
Editor: José Ferreira Gomes
DOI: [https://doi.org/10.24927/rce2021.019]
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[editar] Resumo

Correntes contínuas criam um campo magnético independente do tempo, sendo aqui deduzidas expressões gerais entre as fontes e o campo ilustradas por exemplos característicos e importantes, tais como espiras, solenóides e esferas carregadas em rotação uniforme. É introduzido o importante conceito de potencial vetorial magnético, um auxiliar no cálculo do campo magnético que permite obter a relação exata entre este e as correntes e que se reduz, em limites apropriados, à lei de Biot e Savart. Outro importante conceito é o momento magnético de uma distribuição de correntes, salientando- se que existem tais momentos de forma intrínseca para os quais se deduz o campo magnético por eles originado. A análise das forças que um campo magnético exerce sobre correntes é reservado para outro artigo.


O campo magnético estacionário é originado por correntes contínuas, não dependendo, pois, do tempo. Tal campo é regido pelo seguinte par das equações de Maxwell[1]:

B=0 (1)

B=μ0i (2)

Comparando com as equações da Eletrostática[2], conclui-se que a eq. (1) significa a inexistência de cargas magnéticas, pelo que as linhas de força do campo magnético são sempre fechadas. Pelo mesmo motivo, é contínua a componente normal do campo magnético através de qualquer superfície, mesmo que existam correntes superficiais.

A eq. (2), obtida primeiramente por Ampére, relaciona o campo com as correntes. É muito útil considerar a sua forma integral. Para isso, considere-se uma linha fechada C onde se arbitra um sentido de circulação (FIGURA 1) – deste modo, fica definido, em cada ponto da linha, um vetor infinitesimal dl, tangente à linha, com o sentido da circulação e grandeza |dl|, o elemento de comprimento na linha. Designa-se por circulação do campo ao longo de C o integral (soma) CdlB. Seja, agora, uma qualquer superfície aberta a CdlB que se apoie em C.


FIGURA 1. Contorno fechado e superfície que nele se apoia.

Em cada ponto desta superfície, fica definido o versor da normal n cujo sentido está relacionado com o sentido da circulação pela regra do saca-rolhas. Ora, pelo teorema de Stokes, tem-se[3]:

CdlB=ΣadSn(B)=μ0ΣadSniμ0I (3)


onde I é a intensidade da corrente que atravessa a superfície Σa no sentido da normal definida. Esta eq. (3) é, muitas vezes, suficiente para determinar o campo magnético, como se mostra em alguns exemplos abaixo. Interessa, aqui, usá-la para estudar a descontinuidade da componente tangencial do campo através de superfícies onde existam correntes superficiais.

Tais correntes são uma idealização: qualquer corrente distribui-se, realmente, no espaço mas se estiver confinada a uma estreita vizinhança de uma superfície, é útil atribui-la inteiramente à superfície. Na FIGURA 2 considera-se uma tal superfície onde, num ponto qualquer, se define o versor da normal (de sentido arbitrário) e um pequeno vetor dl no plano tangente. Então, is(ndl) é a intensidade da corrente que atravessa o comprimento |dl|.


FIGURA 2. Correntes superficiais.

Construa-se, agora, um pequeno retângulo no plano determinado por n e dl, e defina- -se o sentido de circulação (FIGURA 3). Seja B1 o campo abaixo do plano e B2 o campo acima do plano. Lembrando que a componente normal do campo é contínua, obtem-se pela eq. (3):

dlB=(B2B1)dl=μ0is(ndl)=μ0(isn)dl


Como o elemento dl é arbitrário na superfície, conclui-se:

B2B1=μ0isnn(B2B1)=μ0is (4)


É esta a relação procurada para a descontinuidade das componentes tangenciais do campo.

Os exemplos seguintes ilustram a determinação do campo em várias situações de interesse.


FIGURA 3. Descontinuidade da componente tangencial do campo magnético.

Corrente uniforme em fio retilíneo

A FIGURA 4 representa um fio cilíndrico (raio R) de comprimento ilimitado percorrido por uma corrente de intensidade I. É útil usar coordenadas cilíndricas com o eixo z coincidente com o eixo do cilindro. Considere-se um ponto P, interior ou exterior ao cilindro. O plano definido por este ponto e o eixo do cilindro é um plano de simetria por reflexão do sistema.


FIGURA 4. Campo magnético gerado por corrente em fio cilíndrico.

Ora, sendo B um pseudovetor, então, por reflexão neste plano, trocam de sinal as suas componentes paralelas ao plano e é invariante a sua componente Bϕ perpendicular ao plano. Assim, é Br=Bz=0. A simetria de rotação em torno do cilindro e a simetria de translação ao longo do cilindro indicam que é Bϕ(r). Seja, agora, uma circunferência (raio r) perpendicular ao eixo e nele centrada. Usando a eq. (3), tem-se:

r>RBϕ2πr=μ0IBϕ=μ0I2πr

r<RBϕ2πr=μ0IπR2πr2Bϕ=μ0IrR (5)


Note-se que o campo é contínuo em R: não há correntes superficiais.


Corrente circular uniforme na superfície de um cilindro ilimitado

A FIGURA 5 representa um cilindro de comprimento ilimitado e secção reta circular (raio a). Na superfície do cilindro existe uma corrente superficial, circular e uniforme (is).


FIGURA 5. Correntes transversais criam campo confinado ao interior do cilindro.

Tomando o eixo do cilindro para eixo z de coordenadas cilíndricas, é imediato verificar que o pseudovetor B só tem não nula a componente Bz devido à simetria de reflexão em qualquer plano normal ao eixo do cilindro. A simetria de rotação em torno deste eixo e a eq. (1) informam que só poderá ser Bz(r); mas, no exterior do cilindro, sendo nulo o 2º membro da eq. (2), então Bz terá de ser constante e esta tem de ser nula porque o campo deve anular-se longe do cilindro. Assim, Bz está confinado ao interior do cilindro, onde não pode depender de r pela eq. (2). Segue-se que Bz é constante no interior do cilindro, obtendo-se, por aplicação da eq. (4):

Bz=μ0isr<a (6)


Se o mesmo cilindro for percorrido por uma corrente superficial longitudinal (i.e. paralela ao eixo do cilindro), com a geometria da FIGURA 4, o campo é nulo no interior do cilindro e, no exterior, as suas linhas de força são circulares:

Bϕ=0r<a

Bϕ=μ0isarr>a (7)


Estes dois resultados permitem-nos modelizar o campo gerado por um solenóide (FIGURA 6). O enrolamento ao longo do cilindro é helicoidal com um passo h, de modo que a equação da hélice é z=hϕ2π, originando o versor da tangente (em coordenadas cilíndricas) τ=cosαeϕ+senez, com cosα=αa2+(h2π)2.


FIGURA 6. Solenóide.

Deste modo, a densidade superficial de corrente fica is=isτ. Considere-se um pequeno comprimento δz de uma, qualquer, geratriz do cilindro. A corrente que passa através deste elemento é, por definição, iseϕδz=iscosαδz. Por outro lado, há nδz enrolamentos que atravessam aquele comprimento, onde n é o número de enrolamentos por unidade de comprimento da geratriz. Cada enrolamento transporta a corrente de intensidade I, pelo que iscosαδz=Inδz, i.e., is=nIcosα, originando o respetivo vetor is=nIcosατ=nIez+nItgαez. Esta corrente é, pois, a soma de uma corrente circular, perpendicular ao eixo do cilindro, is=nIeϕ com uma corrente longitudinal i||s=nItgαez, paralela àquele eixo. A primeira gera um campo no interior do cilindro (ver eq. (6)):

Bz=μ0nIr<a (8)


A segunda gera um campo no exterior do cilindro (ver eq. (7):

Bϕ=μ0nItgαar=μ0nIh2πrr>a


Para um enrolamento muito apertado (ha), este campo exterior é muito fraco e, na realidade, é dominado, para um solenóide de comprimento finito, pelo primeiro campo que fecha as suas linhas de força no exterior do cilindro (FIGURA 6).


O potencial vetor magnético

A eq. (1) é automaticamente satisfeitas se se escrever:

B=A (9)


O potencial vetor magnético A é um vetor polar[4] e a sua definição fica aqui completada com a escolha do padrão de Coulomb:

A=0 (10)


Nestas condições, a equação de Maxwell-Ampére (eq. (2)) fica:

ΔA=μ0i (11)


Comparando com a equação de Poisson da Eletrostática, é imediato concluir que a sua solução particular é:

A(r)=μ04πdVi(r)|rr| (12)


Esta expressão sugere, muitas vezes, que o potencial vetor magnético apresenta a mesma geometria das correntes, o que muito facilita a procura de soluções.

É fácil mostrar que satisfaz à condição (10) porque as correntes são estacionárias (i=0). O campo magnético obtém-se, agora, da eq. (9):

B(r)=μ04πdV(1|rr|)i(r)=μ04πdVi(r)rr|rr|3 (13)


Para correntes em fios finos, percorridos por uma corrente I basta substituir dVi(r)Idl, obtendo-se assim a lei de Biot e Savart:

B(r)=μ0I4πdlrr|rr|3 (14)


O integral faz-se ao longo do circuito onde dl é um pequeno vetor, tangente em cada ponto ao circuito, com o sentido da corrente e grandeza igual ao elemento de comprimento. Deve observar-se que a eq. (14) perde validade na imediata vizinhança do fio condutor porque aí se faz sentir a espessura finita do fio, devendo então empregar-se a eq. (13) de validade genérica.

A FIGURA 7 representa uma espira circular (raio R) percorrida por uma corrente I. Pretende- se calcular o campo magnético a grandes distâncias da espira (rR). A eq. (12) adaptada a esta geometria, fica:

A(r)=μ0I4πRdϕeϕ|rr|μ0I4πRrdϕeϕ(1+rrr2)


FIGURA 7. Campo magnético gerado por corrente em espira circular.

No último membro, o 1º termo é nulo; quanto ao seguinte, usando coordenadas esféricas com a origem no centro da espira e o eixo z coincidente com o eixo da espira, tem-se (FIGURA 8):

rr=rsenθRcos(ϕϕ). Lembrando que eϕ=(senϕ,cosϕ,0) nos eixos cartesianos, obtem-se:

A(r)=μ04πIsen(θ)R2r2πeϕ


Donde (eq. (9)) o campo magnético:

B(r)μ0=IπR24πr3(2cosθer+senθeθ) (15)


A grandeza IπR2μ é o momento magnético da espira, um importante conceito que se discutirá adiante.


FIGURA 8. Campo magnético a grandes distâncias de corrente circular.

É interessante observar que se se empilharem idênticas espiras, o campo, no exterior deste conjunto, vai anular-se, ficando confinado ao seu interior e nas extremidades do empilhamento, tal como se encontrou no solenóide.

É, também, fácil calcular o campo ao longo do eixo da espira. A simetria de reflexão no plano da espira indica que apenas sobrevive a componente Bz e, como o campo é um pseudo vetor, deve ser função par de z.


FIGURA 9. Campo magnético ao longo do eixo da espira.

Usando a eq. (14), tem-se (FIGURA 9):

B=μ04πIR(R2+z2)322π0dϕ(zer+Rez)=μ02IR2(R2+z2)32ez


Um segundo exemplo considera uma distribuição uniforme de carga na superfície de uma esfera em rotação uniforme (velocidade angular ω). Há, assim, uma densidade de corrente superficial:

is=ρsv=ρsωr=ρsωRsenθeϕ (em coordenadas esféricas – FIGURA 10).



FIGURA 10. Esfera em rotação com carga superficial.

Tal sugere, juntamente com a simetria do problema, que o potencial vetor magnético tenha a forma A(r)=A(r,θ)eϕ. Usando a eq. (9), obtem-se para o campo magnético:

Bμ0=1rsenθθ(senθA)er1rr(rA)eθ


Como B=0 dentro e fora da esfera, tem-se:

2r2(rA)+1rsenθθ(1senθθ(senA))=0


A expressão da densidade de corrente sugere a forma A(r, ) = f (r) sen . Substituindo, encontra-se:

d2dr2(rf)2rf=0


Esta equação tem as soluções fr e f1r2. Assim, tem-se:

r>RA(r)=Cr2senθBμ0=2Cr3cosθer+Cr3senθeθ

r<RA(r)=DrsenθBμ0=2Dcosθer+2Dsenθeθ=2Dez


As constantes C e D são determinadas pelas condições na superfície da esfera:

- continuidade de A(R,θ)CR3=D

- descontinuidade de Bθ(R,θ) (eq. (4)) CR3+2D=ρsωR


Deste modo, o campo magnético fica:

r>RBμ0=ρsωR43r3(2cosθer+seneθ)

r<RBμ0=2ρsωR3cosθer2ρsωR3senθeθ=2ρsωR3ez


O campo no interior da esfera é uniforme, alinhando com o eixo de rotação. No exterior, comparando com a eq. (15), é o campo dipolar de um momento magnético de grandeza μ=4π3ρsωR4=13QωR2, onde Q é a carga da esfera (FIGURA 11).


FIGURA 11. Linhas de força do campo magnético para esfera em rotação e com carga uniforme na superfície.

Este exemplo tem um certo valor histórico: quando foi descoberto o spin e se verificou que o eletrão tem um momento magnético intrínseco, procurou-se interpretar estes resultados com um modelo para o eletrão idêntico ao do exemplo. Contudo, Pauli objetou que, se assim fosse, com os valores conhecidos para aquelas grandezas e aceitando o raio clássico para o eletrão, então a velocidade da esfera no equador seria superior à velocidade da luz.

Se toda a esfera em rotação estiver carregada uniformemente e procedendo como atrás, mas havendo, agora, continuidade do campo na superfície, encontrar-se-ia:

rRBμ0=ρωR515r3[2cosθer+senθeθ]

rRBμ0=ρωR2[(13r25R2)cosθer(132r25R2)senθeθ]


Reconhece-se o campo dipolar no exterior da esfera.


O momento magnético

Para um sistema de correntes localizadas numa região finita do espaço (átomos, moléculas, etc.) o momento magnético é definido por:

μ12dVri (16)


É fácil mostrar que esta definição gera o resultado mais comum. Para um qualquer circuito elétrico, não necessariamente plano, tem-se:

μ=I2rdl=IS (17)


onde |S| é a área varrida pelo vetor de posição ao descrever o circuito e I é a intensidade da corrente. Se este é plano, então μ=ISn (FIGURA 12), onde n é o versor da normal ao plano com o sentido definido pela circulação da corrente (regra do saca-rolhas).


FIGURA 12. Definição comum do momento magnético.

Considerem-se, agora, correntes de transporte (i=ρv) e admita-se que os transportadores de carga (eletrões, iões) têm uma relação constante entre a sua carga e a sua massa (por exemplo, e qe/me para eletrões). Então, a razão entre as densidades de carga e massa (ρρm) é constante. Assim, a eq. (16) fica:

μ=12dVr(ρv)=ρ2ρmdVr(ρmv)=ρ2ρmL


Aqui, L é o momento cinético orbital do sistema constituído pelas cargas. Para eletrões, é:

μ=qe2meL


Na teoria de Bohr para o átomo de hidrogénio, a primeira órbita tem L=h2π(h é a constante de Planck). O momento magnético associado é o magnetão de Bohr: μB=qe2meh2π. Designa-se por fator giromagnético orbital a razão entre o momento magnético (em unidades do magnetão de Bohr) e o momento cinético (em unidades de h2π); para o eletrão, é go=(μμB)Lh2π=1. Mas o eletrão também tem um momento cinético intrínseco – o spin – de valor s=h4π e um momento magnético intrínseco igual a um magnetão de Bohr. Assim, o fator giromagnético para o spin do eletrão é gs=2. Para átomos ou iões, a respetiva estrutura eletrónica determina um arranjo quer dos momentos cinéticos quer dos momentos magnéticos que definem uma diversidade muito rica dos níveis energéticos, tal como inicialmente apresentada sob a forma de modelo vetorial do átomo. A diferença entre os fatores giromagnético e de spin determinam o fator giromagnético de Landé, a razão entre o momento magnético total (em unidades do magnetão de Bohr) e o momento cinético total (em unidades de h2π) que explica quer o levantamento de degenerescências quer o comportamento do átomo ou ião sob acção de campos magnéticos aplicados. Não será prosseguido aqui este importante tópico.

Voltando ao momento magnético intrínseco do eletrão, a correspondente densidade de corrente escreve-se i=m, com m localizado no eletrão e satisfazendo a condição:

dVm=μs (18)


onde μs é o momento magnético de spin. No Apêndice 1 é mostrado que esta densidade de corrente, inserida na eq. (16), faz identificar μ=μs.

Este resultado é importante pelo seguinte motivo. Em Eletrostática também se considerou o momento dipolar elétrico de um sistema de cargas[5]. É um conceito útil porque permite obter o campo elétrico a grandes distâncias daquela distribuição, se esta tiver carga total nula. Mas se se aproximar da distribuição, o dipolo elétrico perde importância porque a distribuição fica resolvida como um conjunto de cargas – não existem dipolos elétricos elementares. Não é assim com o momento magnético do eletrão (e de outras partículas elementares): por muito que dele se se aproxime, aquele momento não fica resolvido como um sistema de correntes. É verdadeiramente uma propriedade do eletrão como ponto material (i.e., sem estrutura), tal como a sua carga elétrica ou a sua massa. É, por isso, importante, determinar o campo magnético gerado pelo momento magnético do eletrão.

Para isso, usando i=m na eq. (2), tem-se:

(Bμ0m)=0


Definido:

HBμ0m (19)


este campo satisfaz às condições seguintes:

H=0H=ψ

H=mΔψ=m


A última equação é idêntica à equação de Poisson da Eletrostática, aparecendo m como uma “densidade de carga”. Aproveitando a solução aí encontrada, tem-se:

ψ(r)=14dVm(r)|rr|


Aqui, é o operador gradiente que atua sobre as componentes de r. O integrando pode ser transformado pela identidade:

m(r)|rr|=[m(r)|rr|]m(r)(1|rr|)


O primeiro termo, inserido no integral, converte-se num fluxo (Gauss) através de uma superfície esférica de raio arbitrariamente grande, pelo que é nulo. Quanto ao segundo termo, atenta à identidade (1|rr|)=(1|rr|), origina:

ψ(r)=14πdVm(r)|rr|=14πμs|rr1|=14πμs(rr1)|rr1|3


porque m(r) está concentrado[6] num ponto que, por escolha, se localiza em r1. A expressão final é muito semelhante ao potencial originado por um dipólo elétrico e, por isso, designa-se ψ por potencial magnético (é, contudo, um pseudo-escalar). Deste modo, o campo H fica:

H(r)=14π3μs(rr1)(rr1μs|rr1|2)|rr1|5 (20)


Reconhece-se este campo H em alguns dos exemplos anteriores. Finalmente, o campo magnético (eq. (19):

B(r)μ0=14π3μs(rr1)(rr1)μs|rr1|2|rr1|5+m(r) (21)


É, então, este o campo gerado por um momento magnético “pontual” – o último termo está, apenas, localizado no ponto r1. É nulo para rr1, mas a sua importância não pode ser desprezada pois manifesta-se na origem da risca de 21 cm que caracteriza o espectro do hidrogénio em Cosmologia.

Será evidente que, para uma coleção de momentos magnéticos intrínsecos, o campo magnético é a soma dos campos originados por cada um.

Um importante resultado, demonstrado no Apêndice 2, considera um sistema de correntes confinadas a uma região finita do espaço e que, portanto, satisfaz:

dVi(r)=0 (22)


Então, o momento magnético definido para tais correntes (eq. (16)) obedece à relação:

μ=dVB(r)μ0+12dSr(nB(r)μ0) (23)


O primeiro integral é estendido a todo o espaço e o segundo refere-se a uma superfície esférica de raio arbitrariamente grande (n é o versor da normal exterior). É fácil, embora trabalhoso, verificar que o resultado expresso pela eq. (21) satisfaz a relação anterior, sendo essencial a presença do último termo naquela equação.


A expansão multipolar

Partindo da eq. (12), considerando as correntes localizadas numa região finita do espaço, escolha-se um ponto de observação bem afastado das correntes. Tem-se:

A(r)=μ04πrdVi(r)[1+rrr2+...]


Os termos ignorados definem momentos quadrupolares, etc. O integral do primeiro termo é nulo. Quanto ao segundo, usem-se os resultados obtidos no Apêndice 2, para obter (exemplifica-se com a componente segundo x1):

A1(r)=μ04πr3dVi1(r)rr=μ04πr3dVi1(r)(x1x2+x3x3)=

=μ04πr3(x2μ3+x3μ2)=μ04πr3(μr)1

=μ04πr3(x2μ3+x3μ2)=μ04πr3(μr)1


Com idêntico procedimento para as outras componentes, tem-se finalmente:

A(r)=μ04πr3μr (24)


Donde:

Bμ0=Aμ0=14π(3(μr)rμr2r5)


É o campo de um dipólo magnético (ver eq. (20)). Deste modo, a grandes distâncias de correntes localizadas (átomos, moléculas, espiras, etc.), o campo magnético é o do dipólo magnético associado ao sistema de correntes.

A Terra possui um campo magnético que, à superfície, tem uma intensidade entre 25 e 65 μT (1 tesla=1Wb/m2=104 gauss), estimando-se, assim, H6504πA/M no pólo norte magnético (que é, aproximadamente, o pólo sul geográfico). Tal corresponde a um momento magnético localizado no centro da Terra (R6400 km ) de grandeza μ65×1012Am2. O campo magnético no exterior da Terra deflecte partículas carregadas (raios cósmicos, vento solar) para os pólos magnéticos onde interagem com a alta atmosfera criando auroras boreais. Neste artigo foram apenas consideradas propriedades genéricas do campo magnético estacionário. Ora, tal campo manifesta-se através de forças que exerce sobre correntes, realizando trabalho e conduzindo à identificação de uma energia magnética. Estes são importantes tópicos a considerar noutro artigo.


Apêndice 1 - Demostração de μs, definido na eq. (18), ser um momento magnético.

Com efeito, usando i=m na eq. (16), tem-se:

μ=12dVr(m)=12dV[m(rm)rm]


onde m significa que o operador gradiente só atua sobre m. Ora, m(rm)=(rm)r(rm)=(rm)m , inserido no integral inicial, converte-se (teorema de Gauss) num fluxo sobre uma superfície esférica de raio arbitrariamente grande onde m é nulo, pelo que é nula tal contribuição. Quanto ao (pseudo) vetor rm, considere-se uma sua componente genérica: rmi=jxjmixj=j(xjmi)xj3mi. Inserindo no integral, o primeiro termo desta expressão anula-se pelo motivo anterior. Assim, o integral fica 12dV[m(rm)rm]=12dV(m+3m)=dVm=μs confirmando a identificação de μs como momento magnético.


Apêndice 2 - Demonstração da eq. (23)

Considere-se o integral dVxki(r), onde xk é uma componente genérica do vetor de posição. Utilizando a eq. (2), tem-se:

dVxki(r)=dVxkBμ0=dV[(xkBμ0)ekBμ0]=ΣdS(nBμ0)xkdVekBμ0


Aqui, usou-se o teorema de Gauss para converter o primeiro termo num integral sobre uma superfície (esférica), de normal exterior n e de raio arbitrariamente grande, no interior da qual se localizam as correntes. Projectando no eixo cartesiano xj, obtem-se:

dVxkij(r)=dVekBμ0ej+ΣdS(nBμ0)xk=

=dVejekBμ0+ΣdS(nBμ0)xk (25)


Donde:

12dV[xkij(r)xjik(r)]=dVejekBμ0+12ΣdS[(nBμ0)xk(nBμ0)xj]


Considere-se, por exemplo, k=1 e j=2. Atendendo à definição de momento magnético (eq. (16)), vem:

μ3=dVB3μ0+12ΣdS[r(nBμ0)]3


Idênticos procedimentos para as outras duas escolhas independentes dos índices k e j, resultam na eq. (23).

Regressando à eq. (25), considerem-se agora os elementos diagonais, por exemplo, k=j=1. Tem-se:

dVx1i1(r)=ΣdS(nBμ0)1x1


Aceitando Σ como uma superfície esférica de raio R, o 2º membro fica:

R3ΣdΩ(nBμ0)1n1


O integral é, agora, efectuado sobre as direções definidas pelo ângulo sólido. Este termo é nulo se o campo decair mais rapidamente do que 1/R3. E mesmo para um dipólo magnético, deduz-se da eq. (20) que este termo se reduz a:

14ΣdΩ(nμ)1n1=0


como resulta da integração angular para n1n2 e n1n3. Assim, tem-se:

dVx1i1(r)=0


[editar] Referências

  1. LAGE, E., Os fundamentos do eletromagnetismo, Rev. Ciência Elem., V9(1):016. (2021). DOI: 10.24927/rce2021.016.
  2. LAGE, E., Eletrostática, Rev. Ciência Elem., V9(1):015. (2021). DOI: 10.24927/rce2021.015.
  3. LAGE, E., Gradiente, divergência e rotacional, Rev. Ciência Elem., V8(2):029. (2020). DOI: 10.24927/rce2020.029.
  4. LAGE, E., Os fundamentos do eletromagnetismo, Rev. Ciência Elem., V9(1):016. (2021). DOI: 10.24927/rce2021.016.
  5. LAGE, E., Eletrostática, Rev. Ciência Elem., V9(1):015. (2021). DOI: 10.24927/rce2021.015.
  6. LAGE, E., Eletrostática, Rev. Ciência Elem., V9(1):015. (2021). DOI: 10.24927/rce2021.015.


Criada em 11 de Abril de 2020
Revista em 27 de Janeiro de 2021
Aceite pelo editor em 31 de Março de 2021