SARS-CoV-2

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Referência : Lima, N.R.W., Rezende, C. E., (2020) SARS-CoV-2, Rev. Ciência Elem., V8(4):065
Autor: Neuza Lima e Carlos Eduardo de Rezende
Editor: José Ferreira Gomes
DOI: [https://doi.org/10.24927/rce2020.065]
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Resumo

O novo coronavírus (SARS-CoV-2) trouxe ao mundo um cenário sócio-político e científico de extrema urgência no que se refere ao desenvolvimento de pesquisas nas suas mais diferentes vertentes que sejam capazes de discutir as características e consequências da COVID-19 no âmbito ambiental, da saúde pública e dos problemas econômicos decorrentes, incluindo a necessidade urgente de produzir e aplicar vacinas específicas para prevenir essa doença em todo mundo.


p class='mainText'>O novo coronavírus causa uma Síndrome Respiratória Aguda Grave denominada COVID-19. Inicialmente, esse vírus foi denominado como 2019-nCoV - em inglês: 2019 novel coronavírus; ou também coronavírus de Wuhan, ou ainda vírus da COVID-19. Atualmente, esse vírus é denominado por SARS-CoV-2, sigla construída a partir das palavras em inglês: severe acute respiratory syndrome coronavirus 2.[1], [2]


Quem é esse vírus?

O SARS-CoV-2 foi identificado pelo sequenciamento do genoma do seu RNA. O nome coronavírus foi adotado porque essa família de vírus tem uma estrutura de gliocoproteína, isto é, uma cadeia polipeptídica com trechos de oligossacarídeos que é denominada de spike (espinho em português) por possuir a forma de um esporão que se parece com uma coroa solar[3].

Em termos genéticos, sabe-se que o genoma do novo coronavírus possui 30 quilobases (kb) de RNA. Essa é uma unidade de medida em biologia molecular que significa: 1000 pares de bases. Este tamanho torna o SARS-CoV-2 um dos maiores vírus daqueles que possuem o RNA como material genético[4].

Esse vírus possui quatro genes estruturais principais contidos no RNA do novo coronavírus que, basicamente, codificam as proteínas: (i) a nucleocapsídica (Proteína, N); (ii) a Glicoproteína da espícula (spike, S); (iii) a de membrana (SM); (iv) a glicoproteína de membrana (Envelope, M); (v) uma glicoproteína de membrana adicional (Hemaglitinina Esterase, HE), como ilustrado na FIGURA 1. As proteínas spike e a nucleocapsídica têm sido amplamente estudadas visando a produção de vacinas para proteger a população humana da ação do novo coronavírus e assim evitar a disseminação da doença denominada COVID-19.[5], [6], [7]


FIGURA 1. Desenho esquemático dos componentes do SARS-CoV-2. (Fonte: Nazári, 2020).[8]

Esta doença é altamente contagiosa e muitas vezes mortal, pois se manifesta como uma síndrome respiratória aguda grave, podendo ter efeitos graves nos rins, cérebro e outros órgãos. Porém, ainda se necessita de um maior detalhe sobre o comprometimento destes órgãos. A COVID-19 foi notificada pela primeira vez em 12 de dezembro de 2019, porém há suspeitas de que essa doença já estaria a circular em 1 de dezembro de 2019 por transmissão interespecíficas entre mamíferos e o Homem[9], [10].

Acredita-se que esse vírus surgiu na província de Hubei na região central da República Popular da China, mais especificamente na cidade de Wuhan. Muitos pacientes, que foram inicialmente identificados, teriam sido expostos a animais silvestres no mercado grossista de frutos do mar de Wuhan, onde também são vendidos animais vivos como morcegos, sapos, pássaros, marmotas, coelhos, pangolins, aves silvestres, serpentes, e outros animais criados em cativeiro[11].

O SARS-CoV-2 é o sétimo tipo de coronavírus que infeta humanos5, 6, pertencendo ao grupo Betacoronavírus tipo 2d, mais precisamente à ordem Nidovirales, da subfamília Coronavirina e família Coronaviridae4. Os outros seis tipos de coronavírus que infetam o Homem, são: os dois tipos de alfacoronavírus (229E e NL63) e os quatro dos tipos de betacoronavírus (OC43, HKU1, SARS-COV e MERS-COV).[12]

As partículas do novo coronavírus são esféricas com, aproximadamente, 125 nm de diâmetro e estão revestidas por um envelope fosfolipídico11. O nanómetro (nm) é uma unidade de medida 100.000 vezes menor que o milímetro (mm) e os vírus estudados até ao momento têm diâmetros que variam de 10 a 300nm. Portanto, o novo coronavírus está no grupo de tamanho intermédio entre os 320 mil vírus que foram encontrados em mamíferos[13].

Historicamente, em 1930, os primeiros coronavírus isolados foram aqueles que causam a bronquite infecciosa em Humanos. Em 1940, foi descrito o coronavírus que causa a hepatite em camundongos como também aquele que causa a gastroenterite em porcos. Porém, foi somente em 1965 que esse tipo de vírus foi descrito como coronavírus, em consequência do seu perfil na microscopia eletrônica.[14]

Atualmente, sabe-se com toda a certeza de que os coronavírus podem infetar seres humanos e muitas espécies de animais diferentes, incluindo suínos, bovinos, cavalos, camelos, civeta, pangolins malaios, gatos, cães, roedores, pássaros, morcegos, coelhos, furões, marmotas, serpentes, tartarugas, entre outros animais da vida selvagem[15]. Sabe-se também que galinhas e aves silvestres transmitem outros tipos de coronavírus[16]. Porém, os morcegos são os animais mais apontados como transmissores.


Características dos morcegos e a transmissão de doenças

Os morcegos são sagrados em países da África Ocidental e em Tonga (um reino polinésio), pois acredita-se que representem a manifestação materializada de almas que já foram separadas dos corpos. Na China, são adorados e dizem que trazem boa sorte e felicidade[17]. Em diferentes partes do mundo ocidental, os morcegos são intimamente relacionados com os vampiros, pois acredita-se que estes últimos se metamorfoseiam em morcegos.

Nessas regiões, eles são também símbolo de fantasmas, da morte e da causa de doença. Para os nativos americanos, como os Creeks, Cherokees e Apaches, o morcego é considerado como um espírito impostor entre grupos. Porém, em alguns lugares, o morcego simboliza longevidade e felicidade como no caso da tradição chinesa, bem como na região da Macedônia, entre os países Árabes, na Polônia e no Kwakiutl, região a nordeste da Ilha de Vancouver, na costa canadiana do Oceano Pacífico[18].

Em alguns países asiáticos, os morcegos são muito apreciados na culinária tradicional, contudo, atualmente, o consumo de sua carne foi proibido devido à ameaça que representa para populações humanas por ser um potencial transmissor do novo coronavírus[19], /html>ZHOU, J. et al., Infection of bat and human intestinal organoids by SARS-CoV-2, Nature Medicine, 13 maio 2020.</ref>.


O pangolim e o SARS-CoV-2

O pangolim (do malaio, pangulang - animal que se enrola) é o único mamífero que apresenta escamas. é parecido com o tatu-bola e é considerado como um parente não muito distante dos morcegos por pertencer aos Pegasoferae - um clado de mamíferos placentários que é constituído pelas ordens Chiroptera (morcegos), Carnívora (ursos, leões, gatos e cães), Perissodactyla (cavalos, rinocerontes e antas) e Pholidota que, atualmente, reúne sete espécies de pangolins.

Vários indivíduos dessa espécie foram apreendidos em operações de contrabando no sul da China[20], [21]. Há muito tempo esse animal vem sendo utilizado como alimento e remédio na medicina tradicional chinesa para as populações africanas e asiáticas.

Além de possuir uma carne saborosa, acredita-se que as escamas do pangolim malaio possuem substâncias com poder afrodisíaco que também podem curar a acne, o cancro e, até mesmo, resolver problemas de escassez de leite materno, melhoram a circulação sanguínea, tratam de doenças respiratórias, problemas menstruais e artrite. Esses tipos de aplicações terapêuticas ocorrem tanto na Ásia como na África[22]. Por estas razões, houve um crescimento no contrabando deste animal desobedecendo à proibição do comércio internacional das oito espécies existentes de pangolim que vigora desde 2017[23]. Entretanto, mais recentemente, foi relatado que a sequência genética do coronavírus encontrado no pangolim malaio só tem 90,3% de semelhança com o material encontrado no coronavírus que infeta os seres humanos, estando longe dos 99% de semelhança esperados.


Que animal transmitiu o novo coronavírus para o Homem?

Uma das primeiras possíveis espécies transmissoras do novo coronavírus seria o morcego, como foi descrito, mas há outros casos de transmissão de dois tipos de coronavírus – o SARS-Cov que surgiu em 2002 na China e intermediou a transmissão do MERS que passou pelo camelo antes de chegar ao Homem, em 2012, na Arábia Saudita[24], [25], [26].

Zhixin Liu[27] sugeriu que as tartarugas (Chrysemys picta bellii Schneider, 1783; Chelonia mydas L. 1758; Pelodiscus sinensis Wiegmann, 1835) seriam os potenciais hospedeiros intermediários que transmitiram o SARS-CoV2 aos seres humanos. Um outro estudo foi realizado com intuito de averiguar quais seriam os possíveis reservatórios do SARS CoV-2, Wei Ji e seus colaboradores (2020)[28] pesquisaram a presença do SARS-CoV-2 em oito espécies, incluindo o Homem (FIGURA 2). Para investigar o possível reservatório de vírus, foram realizadas análises abrangentes das sequências dos RNA dos vírus comparando o uso da frequência relativa de códões sinónimos, (FIGURA 2)[29].

Neste estudo (FIGURA 2), foram comparadas 272 sequências genômicas de coronavírus obtidas em animais de várias localizações geográficas. Os resultados demostram que a nova sequência de coronavírus obtida do vírus que causou o surto de pneumonia viral na cidade de Wuhan forma um grupo de genes altamente distinto dos genes do SARS-CoV e dos demais cinco coronavírus que infetam o Homem. Desse modo, os resultados das análises de Ji e sua equipa como também de Zhang[30] e seus colaboradores sugerem que houve uma recombinação homóloga entre os materiais genéticos de coronavírus encontrados no morcego e um coronavírus de origem desconhecida.

Considera-se que os desvios significativos na frequência relativa de códões sinónimos ocorrem por diversos fatores que estão relacionados ao equilíbrio resultante das interações entre mutações e a seleção natural.

Com base nesses dois estudos, se pôde verificar que há diferenças significativas entre os coronavírus presentes nos animais com base nas sequências do RNAs[31], ZHANG, C., et al., Protein structure and sequence reanalysis of 2019-nCoV genome refutes snakes as its intermediate host and the unique similarity between its spike protein insertions and HIV-1., Journal of Proteome Research. 19, 1351- 1360. 2020.</ref>.Esses estudos são importantes para determinar o animal reservatório do novo coronavírus e, assim, entender os mecanismos moleculares envolvidos na sua propagação entre as espécies.


FIGURA 2. Comparação entre a sequência de RNA do novo coronavírus presente em diferentes espécies animais (serpente asiática altamente peçonhenta, a naja, o morcego, a galinha, a marmota, o Homem, o pangolim malaio e o ouriço terrestre, A-H) O gráfico foi construído com resultados obtidos pela técnica baseada no uso da frequência relativa de códões sinónimos[32], ZHANG, C., et al., Protein structure and sequence reanalysis of 2019-nCoV genome refutes snakes as its intermediate host and the unique similarity between its spike protein insertions and HIV-1., Journal of Proteome Research. 19, 1351- 1360. 2020.</ref> Espécies analisadas: (A) Bungarus multicinctus Edward Blyth, 1861; (B) Naja atra Cantor, 1842; (C) Rhinolophus sinicus K. Andersen, 1905; (D) Gallus gallus L. 1758; (E) uma espécie de Marmota não classificada; (F) Homo sapiens L. 1758; (G) Manis javanica Desmarest, 1822; (H) Erinaceus europaeus L. 1758. (Fonte: Modificada da Figura 4B publicada por Ji, et al[33] em 2020).

Outro possível candidato, que pode transmitir esse vírus direto para o Homem, seria o pangolim malaio (Manis javanica Desmarest, 1822). A ligação entre o novo coronavírus que infeta humanos e aquele que infeta o pangolim malaio não foi comprovada[34]. Do mesmo modo, os vírus presentes nas serpentes e no pangolim não apresentaram semelhança de 99% em relação ao novo coronavírus presente em humanos. Do mesmo modo, o morcego, a galinha e a marmota e o ouriço terrestre também não apresentaram vírus com material genético significativamente semelhante com o material genético do SARS-CoV-2 que infeta o Homem[35].

Uma semelhança genética inferior a 99% entre os materiais genéticos dos vírus dos animais analisados por Wei Ji e a sua equipe é considerada imprecisa para sugerir que há semelhança genética entre os tipos de vírus em questão2. Outros estudos, que revelaram valores de semelhança genética entre os tipos de vírus presentes em pangolim malaio e em seres humanos, variaram entre 85,5% a 92,4% - novamente, muito pouco em termos genéticos para se afirmar com certeza que esse animal é o transmissor direto do novo coronavírus para o Homem.[36], [37], [38]

Erros de interpretação nessas comparações genéticas e na tentativa de se encontrar o transmissor desse vírus para nossa espécie, ocorreram porque, inicialmente, foi sequenciado somente o código genético relacionado à proteína spike que está localizada na coroa viral e que é usada pelo vírus para penetrar nas células humanas através do recetor responsável pela conversão da angiotensina enzima 2 ou ACE2, em inglês[39].


Hipótese sobre a origem do SARS-CoV-2

Até o momento, os resultados obtidos sugerem que o SARS-CoV-2 é, possivelmente, fruto da recombinação entre o coronavírus de morcego e um coronavírus de origem desconhecida[40], [41]. Essa recombinação, provavelmente, envolve a glicoproteína que reconhece o recetor da superfície celular dos animais envolvidos2. Assim, uma possível recombinação genética entre os vírus presentes nas espécies de animais selvagens, como o pangolim e animais domesticados, no caso, a galinha, pode ter ocorrido e contribuído para origem e transmissão desse vírus para o Homem[42], [43]. De qualquer forma, ainda há alguns autores que sugerem que os morcegos são os candidatos a protagonizar a transmissão do novo coronavírus para o Homem em decorrência do consumo de sopa deste animal que é uma prática comum na República Popular da China[44].

Os resultados apresentados por Kristian G. Andersen[45] e seus colaboradores em 2020, demonstraram que algumas mutações no gene humano que codificam a ACE2 causaram alteração na estrutura desta proteína podendo, teoricamente, conferir um fator de proteção contra a entrada do SARS-CoV-2. Aliás, isso talvez explique, em parte, porque as pessoas reagem de forma tão diferente ao novo coronavírus, em função da nacionalidade, etnia, faixa etária, condição de saúde, entre outros fatores[46]. Na questão de propensão a desenvolver a COVID-19, verificou-se em Itália e em Espanha que pessoas com sangue do tipo zero negativo eram as que apresentavam menor suscetibilidade para contrair SARS-CoV-2, seguidas das de zero positivo[47]. Curiosamente as pessoas de tipo A parecem ser as mais suscetíveis à doença. Talvez isso explique por que a previsão publicada em 25/03/2020 que noticiou que os índios do Brasil provavelmente seriam dizimados pela COVID-19 felizmente não se concretizou. Isso porque esses índios, em sua maioria, têm sangue do tipo zero negativo[48].


Problemas previstos

Em 2018, Peter Daszak havia alertado a Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre o possível perigo de uma grave Epidemia que seria causada por um tipo de patógeno desconhecido, provavelmente de origem animal, que se poderia espalhar ao redor do mundo e ter uma taxa de mortalidade maior que as das gripes sazonais e, por fim, acabaria por causar um pânico mundial, caracterizando, assim, uma severa e preocupante Pandemia que talvez afetasse animais domésticos e em cativeiro[49], [50].

A notícia do primeiro cão seropositivo para a COVID-19 veio de Hong Kong em 18 de março de 2020 que morreu devido a outra doença aparentemente distinta da COVID-19, pois não houve autópsia. Nessa mesma época, divulgou-se que nessa cidade um cão da raça pastor alemão também estava com o novo coronavírus[51].

Também foram veiculadas as notícias que a tigresa Nádia, que teve contato com tratador doente em New York, no Zoológico do Bronx, continha esse vírus. Um cão da raça pug (Winston, Carolina do Norte) e outro da raça pastor alemão foram outros casos relatados de animais com o novo coronavírus nos Estados Unidos da América[52], [53]. Casos de presença do SARS-CoV-2 foram registrados para gatos, tanto na Bélgica como na República Popular da China porém, a possibilidade de transmissão de animais domésticos para os humanos tem sido até ao momento descartada[54], [55].


Perguntas e possíveis respostas sobre o novo coronavírus

Sabe-se que, até agora, não há ainda cura para a COVID-19 e a intensa discussão sobre o uso da cloroquina continua, pois segundo a OMS, em 4 de junho de 2020 “a cloroquina e a hidroxicloroquina continuam sendo medicamentos aceites como seguros somente para tratar pacientes com malária ou doenças autoimunes”[56]. Até 7 de dezembro de 2020 não se tinha aplicado em caráter não experimental uma vacina que estimulasse a defesa imunológica do nosso corpo contra a presença do novo coronavírus.[57]

Em 8 de dezembro de 2020, a vacinação contra a COVID-19 foi iniciada no Reino Unido. Uma senhora britânica com 90 anos de idade foi a primeira pessoa do mundo a receber a dose da vacina BNT162. Essa vacina foi desenvolvida pelas companhias Pfizer (fundada no ano de 1849, em Nova Iorque, pelos primos e imigrantes alemães Charles Pfizer e Charles Erhart que foi pioneira na produção de antibióticos) e BioNTech (Biopharmaceutical New Technologies da Alemanha que desenvolveu um tratamento terapêutico humano baseado em mRNA para administração intravenosa de realizar a imunoterapia para tratar câncer)[58].

Essa vacina foi testada em 43.500 pessoas voluntárias em seis países e aprovada para uso. É muito cedo para saber se as vacinas COVID-19 fornecerão proteção em pelo menos 90% dos casos a longo prazo. No entanto, é encorajador saber que os dados disponíveis até então (15 de dezembro de 2020) sugerem que a maioria das pessoas que se recuperam de COVID-19 desenvolvem uma resposta imunológica que fornece pelo menos algum período de proteção contra reinfeção - embora ainda estejamos aprendendo o quão forte é essa proteção e por quanto tempo ela durará. Além dessa vacina já em uso, mais 213 vacinas contra o novo coronavírus estão em desenvolvimento, sendo que 51 delas (23%) estão em fase de testes[59].

O que sabemos até o presente momento é que: a COVID-19 é uma doença causada pelo novo coronavírus SARS-CoV-2, que apresenta um quadro clínico que varia de infeções assintomáticas a quadros respiratórios graves com possíveis comprometimentos de outros órgãos. De acordo com a OMS, a maioria dos pacientes com COVID-19 (cerca de 80%) pode ser assintomática e cerca de 20% dos casos podem requerer atendimento hospitalar por apresentarem dificuldade respiratória e, desses casos, aproximadamente 5% podem necessitar de suporte para o tratamento de insuficiência respiratória com suporte ventilatório38. Pouco mais de um ano após a notificação oficial da existência dessa nova doença e com crescentes registros de casos e óbito (QUADRO 1) a cada dia, o que podemos responder sobre a COVID-19?


Quadro 1. Número de casos e óbitos por causa da COVID-19 até 05 de janeiro de 2021.
Fonte: OPAS, Folha informativa COVID-19 - Escritório da OPAS e da OMS no Brasil. 2020. href="https://www.paho.org/pt/covid19">https://www.paho.org/pt/covid19.

Quais são os principais sintomas da COVID-19?

Os sintomas podem variar de um simples resfriado até uma pneumonia severa, sendo os sintomas mais comuns: a tosse, a febre, a coriza, diarreia, a dor de garganta e uma evidente dificuldade para respirar que podem aparecer entre 1 a 14 dias após o contágio. A diminuição do olfato e/ou de paladar (hiosmia e disgueia) ou as perdas destes sentidos (anosmia e ageusia) são sequelas, comprovadamente, atribuídas a essa doença[60], [61], [62].

Como ocorre a transmissão intraespecífica?

A transmissão acontece de uma pessoa doente diretamente para outra ou através do aperto de mão; de gotículas de saliva e do espirro, da tosse, do catarro e das fezes ou, ainda, por meio de objetos ou superfícies contaminadas, como telefones celulares, mesas, maçanetas, brinquedos, teclados de computador, entre muitos outros objetos, tendo em vista a que o vírus se mantenha íntegro fora das células hospedeiras[63]. O estudo de Daniel Stariolo, do Departamento de Física da Universidade Federal Fluminense, foi pré-publicado no The New England Journal of Medicine sugere que os seres humanos, normalmente, emitem os aerossóis contendo vírus enquanto falam, respiram, tossem ou espirram gotículas de saliva com diversos tamanhos que vão desde micrómetro até milímetros[64]. As gotículas maiores caem rapidamente no chão em razão de seu peso, enquanto as muito pequenas podem ficar flutuando no ar até 3 m de distância da pessoa emissora. Isso corrobora as recomendações da OMS sobre a importância de manter uma distância social mínima de dois metros entre as pessoas que se encontram em locais públicos.[65]


Quanto tempo o novo coronavírus se mantém íntegro nas superfícies?

Cabe salientar que os vírus não morrem. Eles se desintegram. Isso porque os vírus não são, tipicamente, seres vivos para muitos porque:

  1. não possuem células;
  2. não apresentam potencial bioquímico que possibilite a produção de energia metabólica;
  3. só se reproduzem no interior de uma célula, sendo considerados parasitas intracelulares obrigatórios[66].


Por outro lado, há pesquisadores que consideram que os vírus são seres vivos[67] porque:

  1. realizam atividades consideravelmente complexas, sendo capazes de “enganar” o nosso sistema imunológico e, assim, causar doenças como a COVID-19;
  2. possuem material genético, RNA ou DNA, sendo capazes de transmitir as suas características aos seus descendentes;
  3. expressam duas atividades vitais e primordiais à vida: reprodução e propagação;
  4. e, por último, têm a capacidade de evoluir, sofrendo alterações genéticas ao longo do tempo, sendo que esta é uma característica relevante, pois somente os seres vivos mais adaptados sobrevivem, ao longo do tempo, às constantes mudanças que ocorrem nos ambientes.


Sabe-se que o novo coronavírus permanece íntegro[68], [69] em:

  • menos de 8 horas em látex;
  • 2 a 8 horas em alumínio;
  • 2 dias em aço;
  • 4 dias na madeira;
  • 4 dias em vidro;
  • 5 dias em metal;
  • até 72 horas em plástico;
  • menos de 4 horas em cobre;
  • menos de 24 horas em papelão.

O novo coronavírus pode facilmente ser destruído pela maioria dos desinfetantes. Assim, pode-se fazer a higienização nas áreas de maior probabilidade de contágio por meio físico, tais como maçanetas, torneiras, corrimãos, bancadas, teclado de computador, mesas, janelas de vidro, botões de elevadores, cédulas de dinheiro e moedas que compartilhamos com outras pessoas, bem como objetos que sempre se tem à mão, como celular, chaves, controle- remoto, bolsa de compras, produtos transportados via correios, entre outros.[70], [71]

Três produtos químicos podem ser eficazes na eliminação do coronavírus[72]>, [73], [74], [75]:

  • Água e sabão;
  • Álcool (70%);
  • Cloro (água sanitária, quatro colheres de chá de água sanitária em um litro de água).


Atualmente, as melhores estratégias de prevenção para evitar a COVID-19[76], [77] são:

  • limpar as mãos com um higienizador à base de álcool ou com água e sabão;
  • evitar tocar nos olhos, na boca ou no nariz;
  • não entrar em casa com sapatos;
  • não permanecer com as roupas que usou fora de casa;
  • tomar banho de corpo inteiro quando vier da rua;
  • tomar a vacina específica.


Como diagnosticar a COVID-19?

O diagnóstico da COVID-19 envolve pessoas com quadro respiratório agudo, caracterizado por sensação febril ou febre, que pode ou não estar presente na hora da consulta (podendo ser relatada ao profissional de saúde), acompanhada de tosse e/ou dor de garganta e/ou coriza e/ou dificuldade respiratória, o que é chamado de Síndrome Gripal.

Pessoa com desconforto respiratório/dificuldade para respirar e/ou pressão persistente no tórax e/ou saturação de oxigênio menor do que 95% em ar ambiente e/ou coloração azulada dos lábios e/ou no rosto[78].


Como se proteger da presença do novo coronavírus?

A lista de 15 atos de prevenção à COVID-19 indicados pela OMS orienta[79], [80] para:

  • Lavar com frequência as mãos até a altura dos punhos, com água e sabão, ou então higienizar com álcool em gel 70%;
  • Ao tossir ou espirrar, cubrir nariz e boca com lenço ou com o braço, e não com as mãos;
  • Evitar tocar olhos, nariz e boca com as mãos não lavadas;
  • Ao tocar, lave sempre as mãos como já indicado;
  • Manter uma distância mínima de cerca de 2 metros de qualquer pessoa tossindo ou espirrando;
  • Evitar abraços, beijos e apertos de mãos;
  • Higienizar com frequência o celular e os brinquedos das crianças;
  • Não compartilhar objetos de uso pessoal, como talheres, toalhas, pratos e copos;
  • Manter os ambientes limpos e bem ventilados;
  • Evitar circular, desnecessariamente, sair às ruas, estádios, teatros, shoppings, shows, cinemas e igrejas, ou seja, se puder, fique em casa;
  • Se estiver doente, evitar contato físico com outras pessoas, principalmente idosos e doentes crônicos;
  • Dormir bem e ter uma alimentação saudável;
  • Utilizar sempre máscaras caseiras ou artesanais feitas de tecido em situações de saída de sua residência;
  • Caso apresente algum tipo de sintomas de gripe, seguir as orientações fazendo o isolamento domiciliar e, também, procure um centro médico, caso necessário.


Segundo o médico Claudio Márcio Amaral de Oliveira Lima: em fevereiro de 2020, na avaliação dos primeiros 99 pacientes internados com pneumonia e diagnóstico laboratorial de COVID-19 no hospital de Wuhan observou-se uma maior taxa de hospitalização em maiores de 50 anos e do sexo masculino.

Os principais sintomas dessa doença até agora diagnosticados foram: febre (83%), tosse (82%), dispneia (31%), mialgia (11%), confusão mental (9%), cefaleia (8%), dor de garganta (5%), rinorreia (4%), dor torácica (2%), diarreia (2%), náuseas e vômitos (1%). Também houve registros de linfopenia em outro estudo realizado com 41 pacientes diagnosticados com COVID-19[81].


O novo coronavírus é uma arma biológica?

Como a proteína de superfície do novo coronavírus (spike) se liga à proteína ACE2 para invadir as células, como mencionado anteriormente, pode-se considerar que esta última proteína funciona como a porta de entrada do novo coronavírus em nossas células[82]. Portanto, com base nas semelhanças genéticas entre os vírus que estão presentes no morcego, no pangolim malaio e em nossa espécie demonstram que a Teoria de Conspiração - “O novo coronavírus é uma arma biológica criada pela China para derrubar a economia ocidental” - é uma suposição falsa e absurda, conforme comprovou o estudo do Kristian Andersen e seus colaboradores[83].

Assim, com certeza, o novo coronavírus não é fruto de uma manipulação laboratorial e sim de mais um processo evolutivo que está acontecendo na nossa Biosfera[84]. Como reflexão final, colocamos aspetos abordados no livro veiculado online: Ferramenta de bolso para agentes de saúde e cuidadores na ativa em defesa da vida na epidemia COVID-19 que foi produzido pela Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), Rio de Janeiro, Brasil.

No contexto da pandemia causada pelo coronavírus (COVID-19) a rotina e estilo de vida da população brasileira (e do mundo) mudou drasticamente[85]. Apesar de a priori a situação exigir medidas de caráter temporário, já se sabe que essa pandemia traz importantes consequências sociais. Ao mesmo tempo, sua vivência coletiva e individual traz experiências novas que geram severos sofrimentos psíquicos em decorrência de diferentes aspetos tais como restrições associadas à sócio-economia, o impacto causado pelo isolamento social, entre outros, e várias incertezas quanto ao nosso quadro sociopolítico.


A COVID-19 e a economia mundial

Segundo o Banco Mundial, há uma estimativa de queda mundial de 6,2% no Produto Interno Bruto (PBI)[86]. Provavelmente, viveremos, num futuro não muito distante, a quarta pior condição econômica já vivida se compararmos com a recessão financeira que se iniciou em 1930 (com queda de 17,6% do PIB) e a Segunda Guerra Mundial (queda de 15,4% do PIB) que se concretizou em 1945. Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI) esta será uma crise nunca vivida, cuja o tempo de recuperação é completamente incerto.

Há previsões de quedas significativas do Produto Interno Bruto (PBI) em todos os países. Por exemplo, Portugal e Brasil que devem ter uma redução no PIB em 8,5% e 5,4%, respetivamente[87], [88], [89], [90]. Apesar dos impactos negativos da COVID-19 nas economias dos países, há uma previsão de que 30 países emergentes e em desenvolvimento deverão crescer em 2021[91], conforme o QUADRO 2.


QUADRO 2. Previsão de países que apresentaram crescimento do PBI em 2021.
(Fonte: Barrucho, 2020)[92].

Conclusão

A situação da Pandemia causada pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2) que estamos vivendo, tem causado mortes e sequelas tanto psicossociais como econômicas na nossa espécie. Tal cenário, tem estimulado pesquisas científicas em todo mundo e em todas as áreas do conhecimento com intuito de discutir, entender e comunicar às pessoas toda e qualquer característica e consequência dessa nova doença, a COVID-19, no âmbito ambiental e da saúde pública e, também, em relação aos graves problemas sócio-econômicos decorrentes da Pandemia. Assim, espera-se que dos 193 países internacionalmente reconhecidos, com governos, territórios e relações econômicas consolidados, somente 30 deles (15,5%) não serão afetados negativamente em termos econômicos.


*Os autores escrevem na variante brasileira do português.

Referências

  1. ANDERSEN, K. G. et al. The proximal origin of SARS-CoV-2, Nature Medicine, 26, 450–452. 2020.
  2. JI, W. et al., Cross-species transmission of the newly identified coronavirus 2019-nCoV, Journal of Medical Virology, 92, 433-440. 2020.
  3. PARASKEVIS, D. Full-genome evolutionary analysis of the novel corona virus (2019-nCoV) rejects the hypothesis of emergence as a result of a recent recombination event, Infection, Genetics and Evolution, v. 79, p. 1-4. 2020.
  4. JI, W. et al., Cross-species transmission of the newly identified coronavirus 2019-nCoV, Journal of Medical Virology, 92, 433-440. 2020.
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Criada em 22 de Junho de 2020
Revista em 31 de Dezembro de 2020
Aceite pelo editor em 31 de Dezembro de 2020