Espécies Invasoras

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Referência : Santos, A.I., Calafate, L., (2018) Espécies Invasoras, Rev. Ciência Elem., V6(1):004
Autores: Ana Isabel Santos, Luís Calafate
Editor: José Ferreira Gomes
DOI: [http://doi.org/10.24927/rce2018.004]

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Devido à globalização, o Homem tem introduzido (intencionalmente ou não) espécies em locais onde estas não ocorrem naturalmente. Estas espécies são chamadas exóticas. A maioria das espécies exóticas vive em harmonia com as espécies nativas. Contudo, algumas podem representar uma ameaça à biodiversidade nativa e levar a uma grande variedade de impactos económicos, sociais e ambientais. Estas espécies denominam-se invasoras (FIGURA 1 A, B e C).

FIGURA 1. Espécies exóticas invasoras presentes em Portugal: A- acácia-de-espigas (Acacia longifolia, B- jacinto-de-água (Eichhornia crassipes) e C- lagostim-vermelho-do-Louisiana (Procambarus clarkii). (fonte: https://imagem.casadasciencias.org)


As espécies exóticas invasoras incluem vírus, fungos, algas, musgos, fetos, plantas superiores, invertebrados, peixes, anfíbios, répteis, aves e mamíferos[1], mas o processo de invasão biológica é comum a todos os grupos taxonómicos[2]. Este processo pode ser dividido em três fases: introdução, naturalização e invasão (FIGURA 2).

Introdução significa que a espécie ultrapassou, com ajuda humana, uma barreira geográfica[3]. Enquanto que as plantas e os vertebrados têm sido intencionalmente introduzidos, a introdução de invertebrados e microrganismos normalmente é acidental[4]. A maioria das espécies exóticas introduzidas sobrevive como casual. Estas espécies podem reproduzir-se, mas são incapazes de manter populações estáveis, dependendo por isso de repetidas introduções para a sua persistência[5].


FIGURA 2. Etapas do processo de invasão biológica (fonte: http://invasoras.pt/o-que-sao/)

A naturalização ocorre quando as barreiras ambientais não impedem os indivíduos de sobreviver e quando as várias barreiras à reprodução regular são ultrapassadas[6]. As espécies exóticas naturalizadas permanecem em equilíbrio no novo ecossistema durante um período de tempo variável. No entanto, numa pequena fração destas espécies este equilíbrio pode ser interrompido por um fenómeno (estímulo, na FIGURA 2) que conduz ao rápido aumento da distribuição da espécie, iniciando-se o processo de invasão propriamente dito[7]. Assim, uma espécie exótica passa a ser considerada invasora quando produz populações reprodutoras numerosas e separadas (espacial e temporalmente) da inicial, independentemente do grau de perturbação do meio e sem intervenção direta do ser humano[8].

As invasões biológicas são um problema crescente em todo o mundo. As espécies exóticas invasoras ameaçam espécies nativas, habitats e ecossistemas[9], estando diretamente relacionadas com o declínio da biodiversidade (e, até mesmo, com a extinção de diversas espécies nativas[10]) e alterações dos serviços ecossistémicos. De facto, as espécies exóticas invasoras não só têm afetado a disponibilidade de água, alimento, fibras e combustível, mas também a polinização, a regulação do clima, a purificação da água, a estabilização do solo, a regulação de pestes, a mitigação de doenças, bem como a recreação, o turismo, a beleza estética, a inspiração, a espiritualidade e a religião[11]. Além disso, as invasões biológicas têm prejudicado diversas atividades humanas, tais como a pesca, a aquacultura, a silvicultura e a criação de gado[12]. Visto que estas alterações implicam perda ou modificação de importantes bens e serviços, a saúde e o bem-estar humano ficam em risco[13], [14], [15].

Por todos os seus impactes, as espécies exóticas invasoras são muito dispendiosas, custando à sociedade europeia mais de 12 mil milhões de euros por ano[16]. A boa notícia é que o ser humano tem a capacidade de atenuar o problema das invasões biológicas, sendo a prevenção a maneira mais eficaz, económica e ambientalmente mais favorável de lidar com este problema. A prevenção visa impedir a introdução de novas espécies exóticas invasoras e limitar o uso de espécies já introduzidas, podendo incluir análises de risco, legislação, fiscalização e atividades de educação ambiental[17], [18]. A educação do público é um factor crucial no combate às espécies exóticas invasoras, pois as pessoas não estando informadas nem sensibilizadas podem contribuir involuntariamente para o agravamento da situação, quer introduzindo novas espécies, quer usando espécies exóticas invasoras já presentes no país.


Situação em Portugal

Em 1999, a legislação portuguesa criou o Decreto-Lei n.º 565/99, de 21 de dezembro com o intuito de regular a introdução de espécies não nativas em Portugal, listar as espécies exóticas e invasoras já introduzidas no país, proibir a introdução de novas espécies, bem como proibir a detenção, criação, cultivo e comercialização destas espécies. De acordo com o Decreto-Lei supramencionado, existem 364 espécies exóticas em Portugal (48 espécies de animais e 316 de plantas), sendo que destas apenas 33 revelam comportamento invasor[19]. Todavia, estudos mais recentes apontam para a presença de um número superior de espécies exóticas e invasoras no território português, confirmando a necessidade de se atualizar o Decreto-Lei em vigor.

Seguidamente, são enumeradas algumas espécies exóticas invasoras de animais e plantas existentes em Portugal Continental.

Alguns dos animais exóticos invasores mais conhecidos incluem o nemátodo-da-madeira-do-pinheiro (Bursaphelenchus xylophilus), a amêijoa-asiática (Corbicula fluminea), o caranguejo-peludo-chinês (Eriocheir sinensis), o lagostim-vermelho-do-Louisiana (Procambarus clarkii), o escaravelho-da-palmeira (Rhynchophorus ferrugineus; FIGURA 3A), o escaravelho-da-batateira (Leptinotarsa decemlineata), a vespa-asiática (Vespa velutina; FIGURA 3B), a tartaruga-da-Flórida (Trachemys scripta; FIGURA 3C), o gambúsia (Gambusia holbrooki), a perca-sol (Lepomis gibbosus), a truta-arco-íris (Oncorhynchus mykiss) e o periquito-de-colar (Psittacula krameri; FIGURA 3D).


FIGURA 3. Espécies de animais exóticos invasores em Portugal: A- escaravelho-da-palmeira (Rhynchophorus ferrugineus), B- vespa-asiática (Vespa velutina), C- tartaruga-da-Flórida (Trachemys scripta) e D- periquito-de-colar (Psittacula krameri) (fonte: wikipedia)


Estas espécies constituem uma das principais causas do declínio da biodiversidade, visto reduzirem comunidades de espécies nativas devido a predação (e.g. tartaruga-da-Flórida e lagostim-vermelho-do-Louisiana), competição (tartaruga-da-Flórida e lagostim-vermelho-do-Louisiana) e transmissão/causa de doenças (nemátodo-da-madeira-do-pinheiro e escaravelho-da-palmeira)[20], [21].

No que às plantas exóticas invasoras diz respeito, as espécies mais conhecidas em Portugal incluem a mimosa (Acacia dealbata; FIGURA 4A), a acácia-de-espigas (Acacia longifolia), a austrália (Acacia melanoxylon), a espanta-lobos (Ailanthus altissima), o chorão-da-praia (Carpobrotus edulis; FIGURA 4B), o jacinto-de-água (Eichhornia crassipes), as azedas (Oxalis pes-caprae), a cana (rundo donax), os penachos (Cortaderia selloana; FIGURA 4C), a bons-dias (Ipomoea indica; FIGURA 4D), a robínia (Robinia pseudoacacia) e o eucalipto (Eucalyptus globulus).


FIGURA 4. Espécies de plantas exóticas invasoras em Portugal: A- mimosa (Acacia dealbata), B- chorão-da-praia (Carpobrotus edulis), C- penachos (Cortaderia selloana) e D- bons-dias (Ipomoea indica) (fonte: http://invasoras.pt/fichas/)


As plantas exóticas invasoras, por competirem mais eficazmente pelos recursos disponíveis (água, luz e nutrientes) do que as espécies nativas, podem substituir total ou parcialmente as comunidades nativas do novo ecossistema. Algumas plantas exóticas invasoras também acarretam impactes nos serviços ecossistémicos de provisionamento (e.g. chorão-da-praia, espanta-lobos e jacinto-de-água), suporte (chorão-da-praia, jacinto-de-água e robínia), regulação (chorão-da-praia, jacinto-de-água, espanta-lobos e robínia) e culturais (chorão-da-praia, jacinto-de-água e espanta-lobos)[22], [23].

Referências

  1. IUCN, em 51st Meeting of the IUCN Council: Gland, Suíça, 2000.
  2. LODGE, D. M. et al., Biological invasions: recommendations for U.S. policy and management, Ecological Applications, 16, 6, 2006.
  3. RICHARDSON, D. M., et al., Diversity and Distributions, 6, 2010.
  4. PIMENTEL, D. et al., Economic and environmental threats of alien plant, animal, and microbe invasions, Agriculture, Ecosystems and Environment, 84, 2001.
  5. RICHARDSON, D. M., et al., Diversity and Distributions, 6, 2010.
  6. RICHARDSON, D. M., et al., Diversity and Distributions, 6, 2010.
  7. MARCHANTE, H. et al., Guia Prático para a Identificação de Plantas Invasoras em Portugal, Coimbra, Portugal, 2014.
  8. MARCHANTE, H. et al., Guia Prático para a Identificação de Plantas Invasoras em Portugal, Coimbra, Portugal, 2014.
  9. CBD, em Subsidiary Body on Scientific, Technical and Technological Advice, Roma, Itália, 2008.
  10. IUCN, em 51st Meeting of the IUCN Council: Gland, Suíça, 2000.
  11. PEJCHAR, L., MOONEY, H.A., Trends in Ecology and Evolution, 24, 9, 2009.
  12. BLACKBURN, T. M. et al., A Unified Classification of Alien Species Based on the Magnitude of their Environmental Impacts, PLoS Biology, 12, 5, 2014.
  13. LODGE, D. M. et al., Biological invasions: recommendations for U.S. policy and management, Ecological Applications, 16, 6, 2006.
  14. MEA, Ecosystems and Human Well-being – Synthesis, Washington, D. C., EUA, 2005.
  15. VILÀ, M. et al., How well do we understand the impacts of alien species on ecosystem services? A pan-European, cross-taxa assessment, Frontiers in Ecology and the Environment, 8, 3, 2010.
  16. MARCHANTE, H. et al., Guia Prático para a Identificação de Plantas Invasoras em Portugal, Coimbra, Portugal, 2014.
  17. MINISTÉRIO DO AMBIENTE, SECRETARIA DE BIODIVERSIDADE E FLORESTAS E COMISSÃO NACIONAL DE BIODIVERSIDADE, em Estratégia Nacional sobre Espécies Exóticas Invasoras: Brasil, 2009.
  18. MARCHANTE, H., Invasion of Portuguese dunes by Acacia longifolia: present status and perspectives for the future. Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, 2011.
  19. Ministério do Ambiente; Decreto-Lei n.º 565/99, de 21 de dezembro. Portugal, 1999.
  20. EEA; EEA technical report Nº 16/2012 – The impacts of invasive alien species in Europe.
  21. ALMEIDA, M. J. S, The paradox of alien invasive species: negative and positive effects on biodiversity and ecossystem services. Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, 2013.
  22. EEA; EEA technical report Nº 16/2012 – The impacts of invasive alien species in Europe.
  23. ALMEIDA, M. J. S, The paradox of alien invasive species: negative and positive effects on biodiversity and ecossystem services. Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, 2013.


Criada em 5 de Janeiro de 2018
Revista em 5 de Fevereiro de 2018
Aceite pelo editor em 14 de Março de 2018