Reação nuclear
Referência : Ribeiro, D., (2015) Reação nuclear, Rev. Ciência Elem., V3(3):180
Autor: Daniel Ribeiro
Editor: Jorge Gonçalves
DOI: [http://doi.org/10.24927/rce2015.180]
Alguns processos nucleares são responsáveis pelo brilho das estrelas mas só em 1920 é que os primeiros processos nucleares foram formalmente estudados, pelo astrónomo Sir Arthur Eddington (1882 – 1944), que propôs modelos estelares que envolviam fusões nucleares. Contudo, só nos anos 30 é que a fusão nuclear foi verificada experimentalmente. Em 1932 a fusão de isótopos de hidrogénio foi conseguida em laboratório e em 1939 o físico nuclear Hans Bethe (1906 – 2005) descreveu os processos de fusão nuclear que ocorrem nas estrelas (nucleossíntese estelar). Em 1938, a fissão nuclear foi, pela primeira vez, observada por Otto Hahn (1879 – 1968) e Fritz Strassmann (1902 – 1980) que dispararam neutrões contra núcleos de urânio com o objetivo de produzir um núcleo mais pesado.[1] Contudo, verificaram a formação de elementos com cerca de metade da massa do urânio. Este facto intrigou os investigadores visto que estava a ser observado um núcleo a partir-se em dois.
Consideremos uma partícula (P) em movimento a embater numa partícula alvo (T) em repouso:
P (partícula projetada) + T (partícula alvo) x (partícula emitida) + R (núcleo residual)
Para este tipo de reações nucleares, desprezando a energia de ligação dos eletrões, podemos estabelecer o seguinte balanço energético
em que Ec(i) e mi são, respectivamente, a energia cinética e a massa da partícula i e c é a velocidade da luz. (Note-se que o produto mic2 também pode ser designado “energia de repouso” de uma partícula. Repare-se, também, que, como se partiu do princípio de que a partícula T estaria em repouso, esta não possui energia cinética.)
Desta forma pode ser definido o valor Q, que corresponde à diferença das massas de repouso dos reagentes pelos produtos
Com esta definição, é possível verificar que, se Q for positivo, a reação nuclear será exoenergética e, consequentemente, se Q for negativo, a reação será endoenergética – a convenção de sinais é oposta da utilizada na variação de entalpia, ΔH, das reações químicas. Assim, com este balanço energético verifica-se que uma das condições necessárias, mais não suficiente, para que ocorra uma reação nuclear é
dado que, para que a reação ocorra, será necessário que as partículas formadas possuam alguma energia cinética.[2]
Para avaliar se uma reacção nuclear é endoenergética ou exoenergética é necessário ter em consideração que, no núcleo, as forças nucleares fortes (atrativas e que mantêm o núcleo coeso) devem estar minimamente equilibradas com as forças electroestáticas (repulsivas que tendem a afastar os protões entre si). As forças nucleares são bastante mais fortes que as forças eletromagnéticas para distâncias até pouco mais de 2 vezes o diâmetro do protão. Para lá dessa distância, as forças eletromagnéticas são superiores às forças nucleares.
Assim, com o aumento do número atómico, maior será a estabilidade do núcleo e, consequentemente, a energia de ligação do núcleo. No entanto isto só acontece até ao limite em que as forças electroestáticas superam as forças nucleares (um pouco mais de 2 vezes o diâmetro do protão). Esse limite é atingido para o elemento químico ferro, Fe; após esse elemento, o aumento do número de nucleões resulta numa diminuição da energia de coesão nuclear – ver figura 1. Isto acontece porque, a partir do ferro, as forças electroestáticas, de natureza repulsiva, começam a superar as forças nucleares, instabilizando o núcleo atómico.
É por este motivo que, até ao elemento químico ferro, a fusão nuclear é uma reação exoenergética e para lá desse elemento é a fissão nuclear que é exoenergética. Em ambos os casos, o facto de a reação ser exoenergética depreende-se com a necessidade de estabilização do núcleo. Por esta razão é que, para obter energia, é necessário fundir núcleos leves ou cindir núcleos pesados.
Existem muitos tipos de reações nucleares: fusão nuclear, fissão nuclear, espalação nuclear, decaimento por emissão de partículas α, decaimento β − , entre outros, como se exemplifica:
Fusão Nuclear
Fissão Nuclear
Espalação Nuclear
Decaimento
Decaimento β −
A escrita de equações que traduzem reações nucleares obedece a duas regras específicas[4]:
- Regra Z – A soma dos números atómicos, Z, das partículas reagentes é igual à soma dos números atómicos dos produtos de reação;
- Regra A – A soma dos números de massa, A, das partículas reagentes é igual à soma dos números de massa dos produtos da reação.
Note-se que a energia envolvida nestes processos é expressa em MeV/átomo em vez de kJ/mol, o que evidencia a enorme diferença entre as ordens de grandeza das energias envolvidas nas reações químicas e nas nucleares.[4] Por exemplo, a combustão do gás propano debita 2220 J por cada mole de gás (3,686 x 10-21 J/molécula de propano) que reage enquanto a referida reação de fissão nuclear do urânio debita 19,3 x 1012 J por cada mole de átomos de urânio-235 (3,20 x 10-11 J/átomo = 200 MeV/átomo).‡
As reações nucleares têm variadas aplicações, dependendo do tipo a que pertencem. Permitem, por exemplo, o abastecimento de redes de energia elétrica, a datação de artefactos históricos e, infelizmente, permitiram a criação do material bélico mais destrutivo do planeta.
‡ Como 1 eV = 1,6022 x 10-19 J, 1 MeV/átomo corresponde a 9,65 x 107 kJ/mol.[5]
Referências
- J. Baker, 50 Ideias Que Precisa Mesmo De Saber – Física, 1ª edição, Alfragide: Publicações Dom Quixote, 2011, ISBN: 978-972-20-4707-4.
- W. Loveland, Modern nuclear chemistry, Hoboken, N.J.: Wiley-Interscience, 2006, ISBN: 978-0-471-11532-8.
- Wikimedia Commons: Binding energy curve - common isotopes, consultado em 08/12/2011.
- C. Corrêa, F. P. Basto, N. Almeida, Química, 1ª edição, Porto: Porto Editora, 2008, ISBN: 978-972-0-42248-4.
- NIST electron volt-joule relationship, consultado em 08/12/2011
Criada em 09 de Fevereiro de 2012
Revista em 20 de Fevereiro de 2012
Aceite pelo editor em 20 de Fevereiro de 2012